sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Os Espíritas: Místicos, Ortodoxos e Agnósticos em face da Doutrina Espírita.


Por Maria das Graças Cabral

 

Vivenciamos na primeira década do século XXI sérias dissenções entre os Espíritas, as quais se arrastam desde o desencarne de Allan Kardec, passando por uma série de fatores que levaram hodiernamente o Espiritismo a vários segmentos.

As discussões se arrastam... De um lado identificam-se os denominados “espíritas místicos”. Estes tornaram o espiritismo uma religião dogmática, ritualística, com líderes religiosos e santos. Seus centros espíritas funcionam no formato de igrejas. Defendem ferrenhamente seus ícones religiosos, e são encontrados em sua grande maioria no Brasil.

Ao centro estão os denominados “espíritas ortodoxos”, que são aqueles que buscam estudar e vivenciar os preceitos Espíritas estabelecidos nas Obras Fundamentais sistematizadas por Kardec.  

Entretanto, dentre estes surgem divergências de cunho interpretativo doutrinário, formando subgrupos. De um lado os “ortodoxos religiosos”, que embora tenham suas bases doutrinárias kardecianas, “entendem o espiritismo como uma religião em seu caráter filosófico, tendo esse, segundo seu entendimento, até mesmo um credo próprio”. Também de certa forma, se assemelham aos místicos quando elegem certos líderes encarnados e/ou desencarnados como seus paradigmas, seu “norte”.

Do outro lado estão os “ortodoxos não religiosos”, que rechaçam o Espiritismo como Religião, pois o entendem como uma doutrina sistematizada que se prende a “todos os ramos da filosofia, da metafísica, da psicologia e da moral”, sem o caráter religioso. Estes se pautam especificamente no estudo das obras fundamentais.

Não obstante, não bastando essas “tribos”, encontram-se no extremo oposto, os “espíritas agnósticos”, posto que, “o agnosticismo pode ser definido de várias maneiras, e às vezes é usado para indicar dúvida ou uma abordagem cética a perguntas. Em alguns sentidos, o agnosticismo é uma posição sobre a diferença entre crença e conhecimento, ao invés de sobre qualquer alegação específica ou crença” - que é o caso dos referidos espiritistas. (In: http://www.dicionarioinformal.com.br. Acesso em 05/10/2012)

Fazendo-se uma análise dos extremos, podemos constatar que os “místicos espíritas”, da mesma forma que os “agnósticos espíritas”, perderam totalmente o referencial kardeciano.

É fato que, enquanto os “místicos” adotaram Chico Xavier como o paradigma do Espiritismo, e suas psicografias como livros doutrinários espíritas - os “agnósticos” questionam a autoridade de Allan Kardec, seu método e os próprios princípios Doutrinários.

Enquanto os “místicos espíritas” idolatram médiuns e espíritos, como os porta-vozes das “novidades espirituais” diante das já “ultrapassadas” e “desnecessárias” “Obras Básicas” - os “agnósticos espíritas” questionam o método kardeciano, a validade do que foi posto pelos Mestres Espirituais, e também já consideram ultrapassadas as Obras Fundamentais.

Portanto, dentre as mais variadas vertentes Espíritas, percebe-se que Allan Kardec e os Princípios Doutrinários se perderam no meio desse turbilhão de pensamentos, convicções, entendimentos e interesses equivocados.

Diante de tal realidade, e sabendo da dificuldade que nós humanos enfrentamos para vencer os grandes vícios que se incrustam em nossa alma por inúmeras encarnações, me aproprio das palavras de Kardec, quando desenvolvia um fantástico diálogo com o Cético na obra O QUE É O ESPIRITISMO, e assim se expressava:

“O mundo corporal e o mundo espiritual alternam-se incessantemente. Pela morte do corpo o mundo corporal oferece seu contingente ao mundo espiritual. Pelo nascimento, o mundo espiritual alimenta a humanidade”. (...)

“Os Espíritos que formam a população invisível da Terra são, de certa maneira, o reflexo do mundo corporal. Encontram-se neles os mesmos vícios e as mesmas virtudes aqui observadas. Existem sábios e ignorantes, pseudosábios, prudentes e levianos, filósofos, calculistas e sistemáticos. Uma vez que não se libertam de suas preocupações, entre eles todas as opiniões políticas e religiosas têm os seus representantes”. (2001: p. 58) (grifo nosso)

Portanto, pode-se vislumbrar o intercâmbio que se faz entre os dois planos da vida no que concerne à Doutrina Espírita, posto que, ela continua incomodando profundamente espíritos encarnados e desencarnados, ainda arraigados a determinadas convicções, gerando dissenção e discórdia entre todos que se consideram de uma forma ou de outra, espíritas.  

Impressiona quão poucos se apercebem que foi o “outro olhar” de Kardec sobre os fenômenos espíritas, saindo do campo das frivolidades para a observação séria através do método experimental, que conduziu às grandes revelações da realidade espiritual, e que estamos longe, muito longe de dominar tal verdade.

Impressiona quão poucos se apercebem que através da dialética, Kardec encontrou respostas dadas pelos grandes Mestres da Espiritualidade, para questionamentos universais, que perseguem o homem desde que tomou consciência de si mesmo. Quem sou eu, de onde vim e para onde vou?

Na realidade, Allan Kardec desenvolveu uma obra monumental, utilizando-se do método experimental para os fenômenos mediúnicos e utilizando-se da racionalidade, do bom senso, da filosofia, e do seu intelecto para sistematizar todo o corpo doutrinário espírita.  

E aqui estamos em pleno século XXI, tendo espíritas temerosos com o “fim do mundo”, em razão das predições feitas por seus ícones religiosos. Outros, questionando o aspecto religioso da Doutrina.  Alguns, pondo em “xeque” a autoridade doutrinária de Kardec e dos princípios espíritas, na busca de outra vertente doutrinária mais avançada e condizente com os “avanços” do pensamento e da ciência. Não se podendo deixar de lado, os espíritas que também rechaçam Jesus como o paradigma da moralidade, que foi inserido no corpo doutrinário espírita por Allan Kardec sob a orientação dos Espíritos Superiores.

Ou seja, a população de espíritos que retornou ao orbe terrestre na condição de encarnados, ainda não se encontra preparada para assimilar a grandiosidade da Doutrina dos Espíritos! Estamos perdidos.

 Vale nesse contexto considerar, a população desencarnada arraigada a determinadas convicções, que interage através das afinidades fluídicas e de pensamento com seus afins do plano físico, fomentando mais e mais as dissensões.

Em face de tal realidade, faz-se por oportuno apresentar os fundamentos do Espiritismo estabelecidos por Kardec na Introdução de O Livro dos Espíritos. Entende-se por óbvio, que diante de tais princípios não caberiam controvérsias entre místicos, ortodoxos ou agnósticos, posto que, são fundamentos doutrinários presentes nas obras fundamentais sob a orientação e aval de O Espírito da Verdade.

Apresento de forma sucinta, quais sejam esses fundamentos elencados por Kardec: 1) a existência de Deus e sua condição de criador de todos os seres animados e inanimados; 2) a existência do mundo espírita como normal, primitivo, eterno, preexistente e sobrevivente a tudo; 3) a existência do mundo corporal e secundário, pois pode deixar de existir ou nunca ter existido sem alterar a essência do mundo espírita; 4) há no homem o corpo material semelhante ao dos animais e animado pelo princípio vital; a alma ou ser imaterial, espírito encarnado no corpo; e o liame que une a alma ao corpo, princípio intermediário entre a matéria e o Espírito (períspirito); 5) os Espíritos pertencem a diferentes classes, não sendo iguais em poder nem inteligência, saber ou moralidade, e evoluem passando pela encarnação, que a uns é imposta como uma expiação e a outros como missão; 6) deixando o corpo, a alma volta ao mundo dos Espíritos, e permanecerá por um lapso de tempo mais ou menos longo durante o qual permanecerá no estado de Espírito errante; 7) a encarnação dos Espíritos ocorre sempre na espécie humana, e as diferentes existências corporais do Espírito são sempre progressivas e jamais retrógradas; 8) a alma tinha a sua individualidade antes da encarnação e a conserva após a separação do corpo; 9) os Espíritos encarnados habitam os diferentes globos do Universo; 10) os Espíritos não encarnados ou errantes não ocupam nenhuma região determinada ou circunscrita; estão por toda parte, no espaço e ao nosso lado, vendo-nos acotovelando-nos sem cessar - é toda uma população invisível que se agita em nosso redor; 11) os Espíritos exercem sobre o mundo moral e mesmo sobre o mundo físico uma ação incessante - agem sobre a matéria e sobre o pensamento e constituem uma das forças da Natureza; 12) as relações dos Espíritos com os homens são constantes, e as comunicações ocultas verificam-se pela influência boa ou má que eles exercem sobre nós sem o sabermos, cabendo ao nosso julgamento, discernir as más e boas inspirações; 13) os Espíritos são atraídos na razão de sua simpatia pela natureza moral do meio que os evoca; 14) a moral dos Espíritos superiores se resume, como a do Cristo, nessa máxima evangélica: “fazer aos outros o que desejamos que os outros nos façam”, dentre outras considerações. (Introdução de O Livro dos Espíritos, p. 32 a 35)

Entretanto, diante da grande complexidade que envolve toda a dissidência e divergência doutrinária, pode-se vislumbrar pelo “andar da carruagem” que ainda percorreremos alguns séculos em meio ao turbilhão de equívocos relacionados ao aprofundamento e/ou entendimento dos preceitos espíritas.

Não obstante, diante dos princípios acima propostos pela Doutrina dos Espíritos, o que nos conforta é saber que a “dimensão temporal” é relativa face à eternidade. Daí advém à certeza de que em “algum tempo”, todos nós avançaremos rumo ao saber e a moralidade. Em tal condição estaremos despidos dos farrapos do orgulho e da vaidade que são os trajes da ignorância, e vestidos com o manto da sabedoria que é a veste dos humildes, pacíficos e felizes. Afinal, conheceremos a verdade e ela nos libertará (palavras de Jesus).

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Editora LAKE. São Paulo/SP. 62ª edição. 2001.

KARDEC, Allan. O Que é o Espiritismo. Editora LAKE. São Paulo/SP. 26ª edição. 2001.

7 comentários:

  1. Maria,
    Texto esclarecer e objetivo. Quanto aos “agnósticos espíritas”, eu ainda não os conhecia, muito embora conceba a existência dos Espíritos agnósticos na erraticidade. Contudo é uma classe que não pode encontrar lugar na Doutrina, uma vez que o agnosticismo, considerando-o em sua concepção primária e excluindo-se as formas flexibilizadas desta tão sedutora corrente, por princípio não concebe o absoluto e não admite que o conhecimento sobre a existência de Deus esteja ao alcance da razão humana. Partindo dessas duas premissas, um indivíduo que professe o agnosticismo não poderia ir além das primeiras perguntas de O Livro dos Espíritos.
    Abraço,
    Edmar Ferreira Jr

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    1. Edmar, boa tarde. Esclarecendo - quando me reporto aos "agnósticos espíritas". Na realidade me utilizo de uma figura de linguagem para retratar aqueles espíritas, que como tratei no texto em comento, questionam, Kardec, seu método, e os Espíritos comunicantes. Abraço.

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  2. Eu também estranhei o termo "agnóstico", ainda mais pela definição utilizada que me parece muito distante do real significado do termo/corrente.

    Acredito que, nos próximos anos, veremos surgir mais espíritas "céticos" (em sentido filosófico), onde creio me encaixar, que vão buscar, cada vez mais, confrontar as informações espíritas com os fatos.

    Enquanto os Ortodoxos ficam brincando de "o que é e o que não é doutrinário", os "céticos", tentarão, cada um à sua maneira, colocar o conhecimento à prova dos fatos e ver o que resiste.

    Bom texto,

    Abraço.

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    1. Deixar claro "o que é e o que não é doutrinário" ainda se faz necessário no movimento espírita brasileiro. Esta exposição, é feita por uma parcela de espíritas que não teme a consequência de seus atos. Defensores que dão as caras a bater, com a simples finalidade de preservar aquilo que foi conquistado à duras penas, nos tempos da codificação. Isso não é também fazer caridade?

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  3. Apenas creio que não há espíritas agnósticos. Se a pessoa começa a duvidar de Kardec, seus métodos etc...NÃO É MAIS ESPÍRITA. São, pois ex - espíritas, querendo ser mais "realistas que o REI". O outro grupo que existe e poderia ser citado era o dos LAICOS do grupo de Santos -SP ligados ao Jaci Régis e a CEPA, que formam o cisma laicista. Veja vídeo do Sérgio Aleixo: http://youtu.be/yG7fEPJuauQ

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    1. Espírita não é aquele que crê cegamente em Kardec . Espírita é aquele que entende a pré-existência do espírito em relaçao ao corpo material e a comunicabiludade entre estes dois mundos

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  4. O Rei é Jesus Cristo.
    Em experiências de quase morte é muito relatada a existência de animais como Chico Xavier defende em seus livros.

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