Por Sérgio Aleixo
Por ser a boa moral, sobretudo a cristã, de inegociável importância ao progresso da alma, nem por isso é o único aspecto a considerar nos ditados mediúnicos. Esta boa moral constitui, aliás, o que mais facilmente pode neles ser julgado e, claro, aceito; todos a aclamam, e só espíritos nada sutis a contrariam abertamente, razão pela qual nos ensinou Kardec: “[...] fora das questões morais, não se deve acolher o que vem dos espíritos senão com reservas e, em todos os casos, jamais aceitá-las sem exame”. (1) Temerário, pois, acolher tudo que um espírito diga simplesmente por ser pura a moral que aconselhe, até porque, segundo ainda o mestre: Há espíritos obsessores sem maldade, que são até mesmo bons, mas dominados pelo orgulho do falso saber. [...] São os mais perigosos porque não vacilam em sofismar e podem impor as mais ridículas utopias. [...] Procuram fascinar por uma linguagem empolada, mais pretensiosa do que profunda, cheia de termos técnicos e enfeitada de palavras grandiosas, como Caridade e Moral. Evitam os maus conselhos, porque sabem que seriam repelidos, de maneira que os enganados os defendem sempre, afirmando: bem vês que nada dizem de mau. Mas a moral é para eles apenas um passaporte, é o de que menos cuidam. O que desejam antes de mais nada é dominar e impor as suas idéias, por mais absurdas que sejam. (2)
Todo cuidado, então, será pouco no que toca aos ditados dos espíritos; com mais forte motivo, quando não se limitam a comunicados concisos, vazados em poucas laudas, e sim, produzem obras de fôlego, de numerosos volumes, recebidos, ao demais, por um único médium, em linguagem pouco acessível e, ao Espiritismo, muito imprópria. Kardec nos avisou: No mundo invisível, como na Terra, não faltam escritores, mas os bons são raros. Tal espírito é apto a ditar uma boa comunicação isolada, a dar excelente conselho particular, mas incapaz de produzir um trabalho de conjunto completo, passível de suportar um exame [...]. (3)
Este é o caso não só de André Luiz, mas de boa parte da “literatura” mediúnica que se acotovela nas estantes de muitas casas espíritas e livrarias leigas, oriunda de espíritos que podem dar excelentes conselhos particulares, mas são incapazes de produzir um trabalho de conjunto completo, passível de suportar um exame.
Herculano Pires, em parceria com o médium Chico Xavier publicou alguns dos seus melhores títulos, não titubeou: André Luiz refere-se a ovóides, espíritos que perderam o seu corpo espiritual e se vêem fechados em si mesmos, envoltos numa espécie de membrana. [...] A ação vampiresca desses ovóides é aceita por muitos espíritas amantes de novidades. Mas essa novidade não tem condições científicas nem respaldo metodológico para ser integrada na Doutrina. Não passa de uma informação isolada de um espírito. Nenhuma pesquisa séria, por pesquisadores competentes, provou a realidade dessa teoria. Não basta o conceito do médium para validá-la. As exigências doutrinárias são muito mais rigorosas no tocante à aceitação de novidades. O Espiritismo estaria sujeito à mais completa deformação, se os espíritas se entregassem ao delírio dos caçadores de novidades. André Luiz manifesta-se como um neófito empolgado pela doutrina, empregando às vezes termos que destoam da terminologia doutrinária e conceitos que nem sempre se ajustam aos princípios espíritas. A ampla liberdade que o Espiritismo faculta aos adeptos tem os seus limites rigorosamente fixados na metodologia kardeciana. (4)
Com efeito, no Diário de São Paulo, antes de se haver constituído, como vimos acima, num crítico mais rigoroso de André Luiz, já dissera o mesmo Herculano Pires, em resposta a Salvador Gentile (1969) e sua “quarta revelação”, ou tese da “revelação luizina”: A obra de André Luiz é ilustrativa da revelação espírita e não propriamente complementar, no sentido de superação que o articulista pretende. É uma grande e bela contribuição nos estudos espíritas, mas sua pedra de toque é a Codificação. O que mais impressionou a Gentile foi a ‘revelação’ de cidades espirituais no espaço. Mas a Bíblia já nos falava da Jerusalém Celeste e as revelações antigas estão cheias de ideias semelhantes. Trata-se de planos ainda materializados da vida espiritual e não dos planos superiores. A Revista Espírita apresenta numerosos relatos dessa vida que se assemelha à terrena. [...] Não há nenhuma razão para se falar em revelação luizina [...]. Antes de pensar em ‘novas revelações’, o de que precisamos com urgência é de estudo sistemático e mais aprofundado da obra de Kardec, incluindo não só os tomos da Codificação mas também a Revista Espírita, por ele mesmo indicada como indispensável ao bom conhecimento da doutrina”. (5)
De fato, o espírito manifesta-se com a empolgação dos iniciantes. Sobretudo, faz uso de um emaranhado de termos: aura, corpo mental, corpo astral, corpo vital, ou etérico, psicossoma, corpo fisiopsicossomático, além do clássico corpo espiritual, corpo fluídico, ou perispírito, onde localizou, porém, centros de força, por duvidosa analogia aos chacras hindus, e a respeito do qual diz que certos espíritos o “gastaram”, assumindo, por isso, “formas ovoides”, mas que teriam sido imperceptíveis aos olhos de André Luiz caso não desenvolvesse, ali, todo o seu potencial de atenção. (6) Uma definição sua de fluido cósmico é “força nervosa do Todo-Sábio”. (7) Não esqueceu a palavra sânscrita “carma”, alheia ao Espiritismo, tanto quanto os termos ectoplasma, materialização, ideoplastia, etc., importados à Metapsíquica, embora não sejam peculiares apenas a André Luiz; impregnam quase todo o pós-Kardec, empenhado na demonstração de que a verdade espírita persistia, apesar do “novo traje” que lhe davam. Isso, contudo, fez pouco bem ao Espiritismo, que sempre emergiu mais racional e consistente de sua própria Codificação do que de certos intercâmbios posteriores, a que desnecessariamente o submeteu a sucessão kardeciana, algumas vezes de todo desatenta aos critérios do mestre que aclamava. (8)
2. ASPECTOS TERRENAIS DO ALÉM-TÚMULO
Muitos criticam, em nome da Codificação, as descrições terrenais das ambiências de além-túmulo nas obras de André Luiz. No entanto, disse Kardec: Independentemente da diversidade dos mundos, essas palavras [‘há muitas moradas na casa do Pai’] podem também ser interpretadas pelo estado feliz ou infeliz dos espíritos na erraticidade. Conforme for ele mais ou menos puro e liberto das atrações materiais, o meio em que estiver, o aspecto das coisas, as sensações que experimentar, as percepções que possuir, tudo isso varia ao infinito (varient à l'infini ). (9)
Trata-se, pois, de uma variação por demais incomensurável para que nela não caibam ambientes deveras assemelhados à Terra, apesar de serem o post-mortem. Nem sempre este há de ser tão abstrato que nos seja indescritível, como o foi ao Sr. Sanson, ex-membro da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, de situação “bem feliz” no além-túmulo, e que afirmou não existirem palavras nas línguas humanas para explicar o que ali viu. Cercado de todos os “sorridentes” protetores da Sociedade fundada por Kardec, concluiu que a felicidade, como a entendemos aqui, “é apenas uma ficção”. (10) Todavia, nessa mesma obra de sua magna Codificação, Kardec ponderou acerca da objetividade e da concretude no mundo espírita: Poder-se-ia perguntar como é que os espíritos se podem evitar no mundo espiritual, uma vez que aí não existem obstáculos materiais nem refúgios impenetráveis à vista. Tudo é, porém, relativo nesse mundo e conforme a natureza fluídica dos seres que o habitam. Só os espíritos superiores têm percepções indefinidas, que nos inferiores são limitadas. Para estes, os obstáculos fluídicos equivalem a obstáculos materiais. Os espíritos furtam-se às vistas dos semelhantes por efeito [da vontade], que atua sobre o envoltório perispiritual e fluidos ambientes. (11)
Tudo, portanto, se explica na medida da relatividade da natureza fluídica mais ou menos compacta dos espíritos. Para os inferiores, há, sim, obstáculos fluídicos, assim como, para nós, os há materiais. Nem tudo, pois, nessa vida de mais além, paira nas brisas do abstrato. Em A Gênese, XIV, 12, o mestre disse também algo soberbo: [...] tudo se liga, tudo se encadeia no Universo; tudo está submetido à grande e harmoniosa lei de unidade, desde a materialidade mais compacta até a mais pura espiritualidade. A Terra é como um vaso de onde escapa uma fumaça densa que vai se aclarando, à medida que ela se eleva, e cujas partes rarefeitas (parcelles raréfiées) se perdem no espaço infinito.
Integram-se, pois, à Terra, por analogia, mas de forma bem significativa, aquelas que seriam suas “partes rarefeitas”, ou seja, seu meio ambiente post-mortem. Decerto, por essas “partes rarefeitas” do planeta é que se espalham o que São Luís chamou, em 23-05-1862, “mundos intermediários”, “viveiros da vida eterna”, nos quais, segundo ele, agrupados em “grandes tribos”, conforme seu grau evolutivo, os espíritos aguardam nova encarnação. Eis o texto, aceito e publicado por Kardec em resposta a uma dúvida de um leitor da Revista: Os mundos intermediários são povoados de espíritos esperando a prova da encarnação, ou aí se preparando de novo, segundo seu grau de adiantamento. Os espíritos, nesses viveiros da vida eterna, estão agrupados e divididos em grandes tribos, uns adiante, outros em atraso no progresso [...]. (12)
Ambiências de além-túmulo com estruturas fluídicas abrigando vida humana de feição bem terrena não colide, pois, com os princípios kardecianos. Aliás, O Livro dos Espíritos, 402, já revelara a existência dessas “sociedades”: O sono liberta parcialmente a alma do corpo. Quando o homem dorme, momentaneamente se encontra no estado em que estará de maneira permanente após a morte. Os espíritos que logo se desprendem da matéria, ao morrerem, tiveram sonhos inteligentes. Esses espíritos, quando dormem, procuram a sociedade dos que lhes são superiores: viajam, conversam e se instruem com eles; trabalham mesmo em obras que encontram concluídas, ao morrer. Destes fatos deveis aprender, uma vez mais, a não ter medo da morte, pois morreis todos os dias, segundo a expressão de um santo. Isto, para os espíritos elevados; pois a massa dos homens que, com a morte, devem permanecer longas horas nessa perturbação, nessa incerteza de que vos têm falado, vão, [enquanto dormem,] seja a mundos inferiores à Terra, onde antigas afeições os chamam, seja à procura de prazeres talvez ainda mais baixos do que [têm] aqui; vão beber doutrinas ainda mais vis, mais ignóbeis, mais nocivas do que as que [professam] entre vós. (13)
Como entender que espíritos encarnados na Terra, ao dormirem seus corpos, atendam ao chamado de antigas afeições ou busquem prazeres ainda mais baixos nesses tais mundos inferiores? Iriam a outros planetas, mundos transitórios, que são fisicamente inabitados e nos quais não estão decerto encarnados? (14) Não creio. Penso tratar-se, aqui, dos mundos intermediários mencionados por São Luís acima, ou seja, como viveiros da vida eterna; desta vez, não outros planetas, mas partes rarefeitas da própria Terra e, por isso, frequentadas também por encarnados durante o sono corporal.
Erasto vem igualmente ao encontro deste entendimento quando assegura que a cegueira moral dos incrédulos os pode aprisionar mais aos laços da matéria, e “impedir que se afastem das regiões terrestres ou similares à Terra”. (15) Ora, neste caso, por que um desencarnado se aprisionaria a outro planeta em detrimento daquele que acabou de deixar? Claro que essas regiões similares à Terra são, portanto, partes rarefeitas dela mesma, em que ainda se ambientam seus espíritos mais atrasados, o que não implica, absolutamente, que lá possam fruir a vida espiritual como se material fosse. André Luiz chega ao extremo de que “persistiam as necessidades fisiológicas, sem modificação”. (16)
3. EXORBITÂNCIAS
3.1. Lei da afinidade dos fluidos
Convidado há pouco para realizar uma exposição acerca de Os Mensageiros, deparei-me, numa releitura após bons 15 anos, com francas assimetrias em relação a Kardec, nunca por mim antes identificadas. Os estudos prolongados da Revista e da Codificação, sem dúvida, me fizeram leitor mais prevenido. A certa altura, então, li que, por “estrada ampla” entre “Nosso Lar” e “os círculos da carne”: [...] os que se dirigem da esfera superior à reencarnação devem seguir com a harmonia possível, sem contato direto com as expressões dos círculos mais baixos. A absorção de elementos inferiores determinaria sérios desequilíbrios no renascimentos deles. Há que evitar semelhantes distúrbios. (17)
Mas como pode alguém vir de esfera superior e absorver elementos inferiores? Outra estranheza é que, uma vez declarada a Segunda Guerra, “avançados núcleos de espiritualidade superior, dos planetas vizinhos, determinaram providências de máxima vigilância nas fronteiras vibratórias mantidas conosco”, isto é, com a Terra. (18) De novo, resta esquecida a lei das afinidades: “Os fluidos se unem pela semelhança de suas naturezas, os fluidos dessemelhantes se repelem; há incompatibilidade entre os bons e os maus fluidos, como entre o óleo e a água”. (19) O que temiam, então, aqueles “núcleos avançados de espiritualidade superior” em suas “fronteiras vibratórias” com a Terra?
3.2. “Nosso Lar” e o Espiritismo
Segundo Os Mensageiros, teriam sido enviadas ao Espiritismo turmas de colaboradores vindos de “Nosso Lar”. Será que essa cidade espiritual carioca, “antiga fundação de portugueses distintos, desencarnados no Brasil, no século XVI (20) ajudou Kardec no séc. XIX? O difícil é imaginar a “distinção” desses portugueses no Brasil Colônia do séc. XVI... Eis o texto: “Desde as primeiras tarefas do Espiritismo renovador, ‘Nosso Lar’ tem enviado diversas turmas ao trabalho de disseminação de valores educativos”. (21)
Não creio. Afinal, o governador da cidade “se apoiava num cajado”, ainda que “de substância luminosa”; meteu alguns em “calabouços” por causa de “intercâmbio clandestino, em virtude dos vícios de alimentação”; a turma por lá tem “Sala de Banho”; acredita em “almas gêmeas”; paga “ingresso” em eventos locais, etc. (22) Muitos deles teriam dado a Kardec o ensejo de observar que há espíritos no além que ainda conservam seus gostos puramente terrenos, mas isso não seria, da parte deles, uma exata disseminação de valores educativos.
Estes valores, ao contrário, foi o mestre lionês quem os ventilou, determinando a absoluta ilusão em que se encontram as entidades nesse estado, necessitadas antes de esclarecimento, não de estímulos à manutenção de um tal quadro alucinatório. (23) É assustador o fato de “alimento físico”, em “Nosso Lar”, ser consumido mesmo pelos mais elevados espíritos da colônia, sob a cínica desculpa de ser isso um “simples problema de materialidade transitória”. (Cap. 18.)
Reflita-se, por exemplo, sobre o caso do mendigo Max; (24) extenuado e com “sede ardente” devorando-o, viu sua situação espiritual modificar-se inteiramente por meio de simples transformação das disposições íntimas. Em momento nenhum houve qualquer estímulo a uma impossível satisfação daquelas necessidades puramente imaginárias, e que eram, aliás, parte da punição de anterior vida terrena em que fora rico proprietário, opressor e dissoluto.
3.3. Boa presença? Ou nem tanto?
André Luiz conta, no cap. 1 de Os Mensageiros: “Regressava frequentemente ao círculo doméstico e aí trabalhava pelo bem de todos, mas sem qualquer estímulo”. Entretanto, já no cap. 14, Aniceto lhe revela que ele, André, “ainda não pôde auxiliar os amigos encarnados porque ainda não adquiriu a devida capacidade para ver.” Parece que o autor espiritual só pensava que estava trabalhando pelo bem de todos, embora isso não correspondesse à verdade, segundo Aniceto. Nem um nem outro esclarece definitivamente o leitor, que fica à deriva.
3.4. O médico ambicioso
Resta igualmente perdido o leitor de Os Mensageiros no estranho caso do médico ambicioso que se desconcentrava durante as cirurgias, por força de transações financeiras que lhe ocupavam a mente, a ponto de “sua colaboração tornar-se quase nula”. Conta-se ali, no cap. 13, que a atitude invigilante do médico teria “comprometido as oportunidades vitais de muita gente, se não fosse a proteção espiritual”. Porém, alguns que terminaram morrendo-lhe na mesa de cirurgia lhe imputavam a culpa do fato e o obsedavam, ainda que se afirme na obra que o médico não tivera culpa nesses casos.
Natural é, contudo, que se duvide, porque morrer nas mãos de um desastrado assim pode constituir, para a vítima, seu adequado gênero de morte, contra o que não há “proteção espiritual” possível. Trata-se de uma questão fundamental da Filosofia Espírita e que Os Mensageiros não puderam ou não quiseram enfrentar; (25) até porque, salvo melhor juízo e a despeito de um ou outro frontispício com fugidias frases kardecianas, nunca se viu nenhum deles abrir ou mencionar uma obra sequer de Allan Kardec nos episódios narrados nos livros, apenas a Bíblia, essa, sim, mais de uma vez.
3.5. O sono dos ateus
Os descrentes, niilistas, materialistas, mesmo ligados a cultos religiosos, segundo Os Mensageiros, cap. 22, literalmente dormem de olhos abertos, vitrificados pelo pavor da morte, com palidez cadavérica, a modo de múmias perfeitas, “magnetizados pelas próprias concepções negativistas”. Mas nem por isso deixam de ter “calor orgânico” e “pulsação regular”. Isso contrasta com os casos de ateus e materialistas entrevistados por Kardec. De qualquer forma, o livro, quando se refere ao número desses dorminhocos, mais uma vez abandona órfão o leitor atento. André Luiz tem uma impressão inicial de centenas. O “chefe do Posto” revela a Aniceto que são 1.980, entre os quais separara os 400 mais suscetíveis de acordar. Por fim, Aniceto fala de “alguns milhões”. Nem com calculadora.
3.6. Círculos elevados
Emmanuel, no prefácio de Os Messageiros, diz que, nos “círculos elevados do Invisível”, onde está André Luiz, há apenas “vida humana sublimada”, em que “grande número de problemas, referentes à Espiritualidade superior, aí espera a criatura, desafiando-lhe o conhecimento para a ascensão sublime aos domínios iluminados da vida”. Sublimada? Com salas de banho, festividades matrimoniais, pagamento de ingressos em eventos locais, crença em almas gêmeas, prisão de alguns em calabouços, alimento físico? Como quer que seja, André Luiz não é um espírito superior, signatário da “quarta revelação”, de um subsídio, uma contribuição, um complemento indispensável à Codificação Espírita. Quem complementa não contradiz!
De um modo que bem lembraria o rustenismo febiano, Lísias explica a André Luiz que há espíritos que “seguem por linhas retas” e outros que “caminham descrevendo grandes curvas”; ensina-lhe que, “em qualquer lugar, o espírito pode precipitar-se nas furnas do mal”, mesmo “nas esferas superiores”, onde “as defesas são mais fortes”; André se admira e usa um termo típico de Roustaing: “[...] a queda sempre me pareceu impossível nas regiões estranhas ao corpo terreno”. (26)
E para que “Nosso Lar” ressalte como lugar de relativa elevação de forma mais convincente ao leitor, chega-se ao cúmulo de classificar “a profundeza dos mares” e “o âmago da Terra” como “zona de Trevas”, “lugar de sofrimento e pavor”, pior que o “Umbral”, que ficaria “da superfície do globo para cima”, não fazendo parte “do nível para baixo”. É a ressurreição do Inferno católico e do Hades pagão! (27)
A coisa toda é muito sutil. Desde o prefácio de “Nosso Lar”, o juízo do “leitor amigo” fora anestesiado pela seguinte conclamação: “[...] em nosso campo doutrinário, precisamos, em verdade, do ESPIRITISMO e do ESPIRITUALISMO, mas, muito mais, de ESPIRITUALIDADE”. Minimizada, assim, a importância superlativa da Doutrina Espírita para a análise das comunicações mediúnicas, a forçosa consequência é uma leitura completamente emocional, onde o leitor, já desarmado, obedece docilmente ao primeiro imperativo do prefaciador: “Guarde a experiência dele [de André Luiz] no livro d’alma”. Perdido de vista o único farol capaz de revelar a natureza encapelada do mar tempestuoso dos ditados de André Luiz, o “leitor amigo” passa a aceitá-los na íntegra, apenas porque encerram lições da mais pura moral. Naufrágio certo à vista.
Sabe-se que Kardec não considerava merecedoras de publicidade nem dez por cento das comunicações de “moralidade irreprochável” que lhe eram enviadas, e destas, apenas a um terço ele atribuía “mérito fora do comum”. Quanto a “manuscritos e trabalhos de fôlego”, não conferia “real valor” senão a uma quinta ou sexta parte do que lhe remetiam. (28) Ao mestre não se afigurava, pois, que ensinar o bem fosse a senha da infalibilidade, nem a condição única para ditados mediúnicos constituírem “Doutrina Espírita”. Bem longe disso.
3.7. Casamentos no além-túmulo
Lendo Os Mensageiros, cap. 30, logo se verifica que a “vida humana” que ali transcorre não é tão “sublimada” como a pretende seu prefaciador jesuíta, pois o texto atribui ao “exclusivismo pernicioso a que nos entregamos no plano carnal” o fato de se estranhar que haja “uniões matrimoniais”, “festividades dessa natureza” no post-mortem. Justifica-se o fato de essas literais festas por lá ocorrerem, imaginem, porque já são belas na Terra. Diz-se ali: “[...] porque deixariam de existir aqui, onde a beleza é sempre mais quintessenciada e mais pura?”. Um dos que lá casaram, e é “funcionário dos Serviços de Investigação do Ministério do Esclarecimento”, manifesta incontida alegria: “E como são felizes os que se casam em nossos planos!”. Segundo André, o funcionário disse-o “denotando aspirações secretas do coração”.
A Codificação Espírita já não veria esses fatos tão benignamente, porquanto ensina que, “entre os espíritos inferiores, não desmaterializados, há muitos que ainda se acreditam na mesma condição terrena, conservando as suas antigas paixões e os seus desejos. Alguns ainda se consideram como homens ou mulheres”, (29) assim como leciona que “não existe união particular e fatal entre duas almas, a união existe entre todos os espíritos, mas em graus diferentes, segundo a ordem que ocupam, a perfeição que adquiriram: quanto mais perfeitos, tanto mais unidos”. (30)
3.8. Volitação e força centrípeta
A certa altura, estando nossos heróis próximos à esfera dos encarnados, Aniceto informa que, por estarem na “zona de influência direta da Crosta”, agora poderiam “praticar a volitação, utilizando conhecimentos de transformação da força centrípeta” (Cap. 33), ou seja, alterariam a força de gravidade do nosso planeta para vencer as suas distâncias. Sabe-se que o perispírito é “suficientemente vaporoso para que possa elevar-se na atmosfera e transportar-se para onde quiser”. (31) Mas isto está a depender de um “conhecimento” específico? Fazemos tantas coisas apenas por instinto, sem nada sabermos de como o fazemos. Os espíritos, da mesma forma. Tanto que, em O Livro dos Médiuns, 99, é relacionado o caso de um desencarnado que realizava transportes de objetos sem sequer suspeitar de como o fazia, o que foi explicado depois por Erasto, mais instruído do ponto de vista teórico. É assim que os espíritos podem elevar-se na nossa atmosfera sem necessariamente precisarem saber como desempenham isso.
De mais a mais, seria preciso um desencarnado “transformar” a força de gravidade para elevar-se na atmosfera da Terra? É a força da gravidade propriamente que resta “transformada” nesse ato de “volitação”? Mais ainda: a gravidade da Terra exerce influência real sobre os espíritos? Eles caem, tombam, por efeito da gravidade? Os espíritos que pensam sofrer a ação da gravidade devem estar na mesma situação dos que não conseguem atravessar paredes ou portas. Isto não se deve às forças da Física, mas a uma ilusão a que espíritos atrasados se entregam. A narrativa pondera a questão muito inadequadamente.
3.9. Criança “morta” mata uma flor “viva”
Os Mensageiros, cap. 37, deveras surpreende com o “assassinato” de um cravo perfumoso promovido por uma pequena carinhosa que o quis dar à sua mãe. A menina (espírito) resolve colher um cravo (matéria) para dá-lo a sua mãe (espírito). Resultado: colheu o “espírito” do cravo. André Luiz conta a façanha testemunhada: “Vi a menina colher a flor, retirá-la da haste, ao mesmo tempo em que a parte material do cravo emurchecia, quase de súbito”. A mãe da menina, desgostada com isso, repreendeu-a severamente, por julgar que a filhinha não tinha o direito de... “perturbar a ordem das coisas”. É este o novo paradigma espírita? A quarta revelação? Uma criança, símbolo da inocência, mata uma flor, símbolo da beleza. Ocorrência tão trágica quanto nossa ingenuidade no movimento espírita.
3.10. Esferas ovoides e segunda morte
Entre as observações e novidades relatadas por André Luiz nos capítulos sexto e sétimo de Libertação, a mais impactante é a perda do veículo perispiritual. Entre os espíritos elevados, seria celebrizada como segunda morte. Nessa ocasião, se desfariam do vaso perispirítico, rumo a esferas sublimes, conquistando planos mais altos. Em defesa, alega-se que Kardec se referiu à mudança de perispírito por ocasião da mudança de mundo; todavia, ao contrário do que acontece ao leitor kardeciano, o luizino não consegue chegar à conclusão imediata de que haverá sempre, mesmo após a suposta segunda morte, necessariamente outro perispírito para a alma. (32)
Poucos leitores de André Luiz vão preencher-lhe essa vaga quando fala, por exemplo, do desenvolvimento do nosso corpo glorioso, estruturado em matéria sublimada e divina. Mas de quantas segundas mortes precisaremos para desenvolver esse corpo glorioso? Faz sentido, então, o conceito de segunda morte? E depois? A terceira? A quarta? A quinta? Tal como assinalara Herculano Pires: “André Luiz manifesta-se como um neófito empolgado pela doutrina, empregando às vezes termos que destoam da terminologia doutrinária e conceitos que nem sempre se ajustam aos princípios espíritas”. (33)
A própria concepção paulina do corpo espiritual foi algo distorcida na obra de André Luiz, para que ali se pudesse falar na perda do perispírito. O que Paulo escreveu foi que o corpo de carne de seus “imitadores” seria transfigurado, conformado ao “corpo glorioso” de Jesus, (34) bem como que, depois de morto o corpo animal, “é ressuscitado em glória” o corpo espiritual, (35) que Kardec explicou ser exatamente o perispírito, de cuja posse, por sinal, já se desfruta sem a segunda morte.
O Espiritismo experimental estudou as propriedades dos fluidos espirituais e a sua ação sobre a matéria. Demonstrou a existência do perispírito, da qual já se suspeitava desde a Antiguidade, e que foi designado por [São] Paulo pelo nome de corpo espiritual, isto é, corpo fluídico da alma após a destruição do corpo tangível. Sabe-se atualmente que esse invólucro é inseparável da alma, que ele é um dos elementos que constituem o ser humano; que é o veículo da transmissão do pensamento e que, durante a vida do corpo, serve de elo entre o espírito e a matéria. (36)
Justificar em Kardec esta revelação sobre os espíritos elevados que “perderam o veículo perispiritual” seria uma temeridade. Até porque a didática luizina foi canhestra. Aprende-se no diálogo entre Jesus e Nicodemos que o iniciante deve entender, primeiramente, as coisas mais baixas; depois compreenderá as mais altas. Inútil fora, pois, tratar destas sem que o iniciante tenha prévio entendimento daquelas. Em André Luiz, contudo, o suposto fato da perda do perispírito entre os mais elevados é o ponto de partida da explicação de outro, análogo, mas no extremo oposto da escala...
Entre os inferiores, alguns se tornariam “formas indecisas, obscuras”, “esferas vivas”, “pequenas esferas ovoides, cada uma das quais pouco maior que um crânio humano”, com “movimento próprio, ao jeito de grandes amebas”, “fetos ou amebas mentais”, porque“gastaram o perispírito”. Não bastasse isso, os que se veem nesse pesadelo esférico seriam ainda “mobilizáveis por entidades perversas ou rebeladas”; e se diz ali, então, que “os ignorantes e os maus, os transviados e os criminosos também perdem, um dia, a forma perispiritual”.
Espíritos elevados também se tornam “pequenas esferas ovoides”? Desenvolver a “forma gloriosa”, depois de “profundos choques biológicos”, é, por fim, também revestir a aparência de “fetos ou amebas mentais”? Verdade que não se afirma isso em Libertação; entretanto, igualmente não se o nega. Bem razoável é a dúvida, em função do próprio roteiro escolhido para explicação do suposto fato entre os inferiores, ou seja, um fato semelhante entre os elevados.
Além do mais, como já ressaltei, a concepção paulina do corpo espiritual foi algo distorcida por André Luiz, a fim de que não restasse evidente sua antilógica em explicar as esferas ovoides entre os inferiores a partir da segunda morte nos superiores, e ainda, sobretudo, porque Paulo foi categórico nisto: “E, assim como trouxemos a imagem do terreno, traremos também a imagem do celestial”. (37) Não há espaço, pois, para ovoides inferiores ou eventuais ovoides superiores no pensamento paulino, já que, segundo ele, a imagem do corpo celestial será a mesma do corpo terreno.
O apóstolo da gentilidade também chega a afirmar ser “necessário que isto que é corruptível se revista da incorruptibilidade e que isto que é mortal se revista da imortalidade” para que se cumpra a palavra: “Tragada foi a morte na vitória”. (38) Os leitores luizinos aprendem, todavia, que não é bem assim, porquanto o perispírito também morre, seria “perecível”. Então, há que corrigir Paulo: “Tragada foi a primeira morte na vitória; mas vem aí a segunda, a terceira, a quarta; preparem-se!”. Sobre o assunto, ponderou Kardec sem ambiguidades: A forma humana, com algumas diferenças de detalhes e as modificações orgânicas exigidas pelo meio em que o ser tem de viver, é a mesma em todos os globos. É, pelo menos, o que dizem os espíritos. E é também a forma de todos os espíritos não encarnados, que só possuem o perispírito. A mesma sob a qual em todos os tempos foram representados os anjos ou espíritos puros. De onde devemos concluir que a forma humana é a forma típica de todos os seres humanos, em qualquer grau a que pertençam. (39)
Para o mestre, como se vê, não há dúvida; da base ao topo da escala, os espíritos têm a forma humana. Adeptos mais aguerridos da revelação luizina podem socorrer-se do que o mestre afirma após o acima citado: Mas a matéria sutil do perispírito não tem a persistência e a rigidez da matéria compacta do corpo. Ela é, se assim podemos dizer, flexível e expansível. Por isso, a forma que ela toma, mesmo que decalcada do corpo, não é absoluta. Ela se molda à vontade do espírito, que pode lhe dar a aparência que quiser, enquanto que o invólucro material lhe ofereceria uma resistência invencível.
Ninguém, contudo, há de tornar-se esfera viva, feto ou ameba mental, por obra do querer de sua vontade; além disso, Kardec tenciona chegar somente ao que diz logo depois, que o espírito pode assumir, pela flexibilidade do perispírito, exatamente a aparência do corpo a que esteve ligado na Terra; com particularidades defeituosas apenas para efeito de identificação, inclusive. Aprende-se, ali, pois, que o perispírito é transformável, mas não que seja perecível, menos ainda pelas razões expostas em André Luiz: ignorância, maldade e crime. Eis a sequência imediata do pensamento do mestre: Desembaraçado do corpo que o comprimia, o perispírito se distende ou se contrai, se transforma, em uma palavra: presta-se a todas as modificações, segundo a vontade que o dirige. É graças a essa propriedade do seu invólucro fluídico que o espírito pode fazer-se reconhecer, quando necessário, tomando exatamente a aparência que tinha na vida física, e até mesmo com os defeitos que possam servir de sinais para o reconhecimento. Os espíritos, portanto, são seres semelhantes a nós, formando ao nosso redor toda uma população que é invisível no seu estado normal.
Desse modo, o leitor de André Luiz resta mais uma vez ao léu do próprio imaginário; e seu senso crítico, sempre anestesiado por insistentes lições de inatacável moral, mas que são estrategicamente intercaladas entre as observações e novidades, a fim de que estas venham a ser acolhidas sem reserva, como acontece em geral, conferindo às obras psicografadas o condão invencível da infalibilidade. [...]
Estas reticências querem ser a seguinte pergunta: quantos subitens poderiam ainda constar desta parte 3 se eu dispusesse, agora, de tempo hábil para uma releitura de fio a pavio da série André Luiz? O fato é que, independentemente dos subitens que ainda poderiam ser aqui relacionados a título de exorbitância em face de princípios espíritas, a conclusão, a parte 4, não mudará nunca.
4. NEM VIDA ESPIRITUAL, NEM VIDA MATERIAL
Uma comunicação aceita por Kardec descreve este quadro: Encontrei lá em cima muitos desses infelizes, mortos nas torturas da fome, ainda procurando em vão satisfazer a uma necessidade imaginária, lutando uns contra os outros para arrancar um pedaço de comida que se escondia em suas mãos, dilacerando-se mutuamente e, se posso dizer, se entredevorando; uma cena horrível, pavorosa, ultrapassando tudo quanto a imaginação humana pode conceber de mais desolador!... Muitos desses infelizes me reconheceram, e seu primeiro grito foi: “Pão!”.
Trata-se de uma alma abnegada e piedosa, morta entre os aflitos dos quais cuidava. (40) Entre outros aprovos de Kardec, lemos estes: A quem quer que não conheça a verdadeira constituição do mundo invisível, parecerá estranho que Espíritos, que segundo eles são seres abstratos, imateriais, indefinidos, sem corpo, sejam vítimas dos horrores da fome; mas o espanto cessa quando se sabe que esses mesmos Espíritos são seres como nós; que têm um corpo, fluídico é verdade, mas que não deixa de ser matéria; que, deixando seu invólucro carnal, certos Espíritos continuam a vida terrestre com as mesmas vicissitudes, durante um tempo mais ou menos longo. Isto parece singular, mas é, e a observação nos ensina que tal é a situação dos Espíritos que viveram mais a vida material do que a vida espiritual, situação por vezes terrível, porque a ilusão das necessidades da carne se faz sentir, e se tem todas as angústias de uma necessidade impossível de satisfazer. [...] Sim, legiões de espíritos continuam a vida corporal com suas torturas e suas angústias. Mas quais? Os que ainda estão muito avassalados à matéria para dela se desprenderem instantaneamente. É uma crueldade do Ser Supremo? Não; é uma lei da Natureza, inerente ao estado de inferioridade dos espíritos e necessária ao seu adiantamento; é uma prolongação mista da vida terrena durante alguns dias, alguns meses, alguns anos, conforme o estado moral dos indivíduos. [...] Aliás, não depende de cada um escapar a essa vida intermediária, que, francamente, nem é a vida material, nem a vida espiritual? Os espíritas a ela escapam naturalmente, porque, compreendendo o estado do mundo espiritual antes de nele entrar, imediatamente se dão conta de sua situação.
Anote-se que Kardec ratifica a realidade do cenário, mas não considera tal estado de coisas, mesmo já no além-túmulo, nem a vida material, claro, nem sequer a vida espiritual propriamente dita. E como tem sido vendida a “série” André Luiz? Não são, por excelência, os livros sobre “a vida no mundo espiritual”? “Prolongação mista da vida terrena” seria mais apropriado, não só a eles como à multidão de seus congêneres que, no dizer de Herculano Pires, findam por “desviar adeptos ingênuos da verdadeira compreensão doutrinária” (41) e, decerto, por deixá-los menos dignos do otimismo de Kardec. Efetivamente, não mais querem certos espíritas escapar a essa “vida intermediária” ainda impregnada de hábitos terrenos; já são maioria entre nós os que almejam, após a morte, santa e piamente, ir para um lugar como “Nosso Lar”, para lá encontrarem suas “almas gêmeas”, de preferência, em meio a construções nababescas, cercadas de jardins a perder de vista e mantidas por logística destinada à impossível satisfação de necessidades que, para o espírito, não podem ser senão imaginárias.
No cap. 26, lê-se: “Temos aqui as grandes fábricas de ‘Nosso Lar’. A preparação de sucos, de tecidos e artefatos em geral, dá trabalho a mais de cem mil criaturas, que se regeneram e se iluminam ao mesmo tempo”. (42) Meu Deus! A regeneração e iluminação espiritual obtida pelo trabalho em fábricas de suco, tecidos e artefatos em geral de além-túmulo. Kardec, no n. 908 de O Livro dos Espíritos, torna-se cada vez mais um eco distante que insiste em avisar: “Toda paixão que aproxima o homem da Natureza animal o afasta da Natureza espiritual. Todo sentimento que eleva o homem acima da Natureza animal anuncia o predomínio do Espírito sobre a matéria e o aproxima da perfeição”.
O mestre lionês instrui-nos à prévia libertação do apego a necessidades impossíveis de serem satisfeitas depois da morte, porquanto não poderão deixar de ser, para o espírito livre, senão a tortura de um estado ilusório, quando não alucinatório. A perspectiva andreluizina já não é esta. Os desencarnados comeriam, beberiam, atenderiam a necessidades fisiológicas, sem que haja nisso, porém, qualquer motivo de censura. Uma encruada moral vegetariana de fundo trata de legitimar a alimentação consumida pelos “mocinhos” da história, deixando aos “vilões” a condenação pelo interesse em alimentação menos elevada. Valha-nos o Espírito de Verdade!
2. O Livro dos Médiuns, 246.
3. Revista Espírita - Mai/1863. Exame das comunicações mediúnicas que nos são enviadas.
4. Vampirismo - II. Parasitas e vampiros. 4.ª ed., Paidéia, 1996, p. 15.
5. Cf. RIZZINI, Jorge. J. Herculano Pires, o Apóstolo de Kardec. Cap. 19. São Paulo: Paideia, 2001, pp. 245/46.
7. Evolução em Dois Mundos, cap. I.
8. Cf. “Léon Denis, Emmanuel e as Almas Gêmeas”, “Liberdade e Consciência no Espiritismo”, “Espiritismo e Ética da Alteridade” e “O Credo Espírita”.
10. O Céu e o Inferno. 2.ª parte, cap. I, Sr. Sanson, II, n. 8.
11. O Céu e o Inferno. 2.ª parte, cap. V, Um Ateu, n. 19.
12. Revista Espírita - Jul/1862. Hereditariedade moral. Médium: Sra. Costel. 2.ª ed., I.D.E., 1993.
13. A tradução de Herculano Pires bem relaciona a palavra sociedade (société des autres êtres supérieurs); ousei aqui reparar tão só os tempos verbais, no presente do indicativo: “mais baixos do que os que eles têm aqui” (plus bas que ceux qu'ils ont ici) e “mais nocivas do que as que professam entre vós” (plus nuisibles que celles qu'ils professent au milieu de vous). A resposta continua se referindo às atividades dos espíritos durante o sono; ali, os feitos dos inferiores. A inserção sobre a perturbação e a incerteza que os aguarda depois da morte é que alonga o período e distancia o entendimento do leitor de que se fala dos momentos de sono corporal desses espíritos, não mais do post-mortem deles. A tradução dos 150 anos de O Livro dos Espíritos (FEB) tornou mais claro o texto, acrescendo as palavras “enquanto dormem” também a este parágrafo que se reporta aos inferiores, como há no anterior as palavras “quando dormem” (quand ils dorment), relativas aos superiores. Apenas não se registrou o vocábulo sociedade, aplicado aos “seres superiores” e que explicita aspecto importante da vida espiritual. Kardec, aliás, usou esta mesma palavra para os grupamentos inferiores de além-túmulo, quando disse que o espírito Feliciano declarou encontrar-se numa “sociedade assaz promíscua e, por conseguinte, de espíritos inferiores” (société très mélangée, et par conséquent d'esprits inférieurs). [O Céu e o Inferno, 2.ª parte, cap. V.]
14. Mozart afiançou que “há mundos particularmente destinados aos seres errantes, mundos que lhes podem servir de habitação temporária, espécies de bivaques, de campos onde descansem de uma demasiado longa erraticidade, estado este sempre um tanto penoso”. Santo Agostinho o confirmou, dizendo que “eles são gradativos, isto é, entre os outros mundos ocupam posições intermédias, de acordo com a natureza dos espíritos que a eles podem ter acesso e onde gozam de maior ou menor bem-estar”, e que “os espíritos que se encontram nesses mundos podem deixá-los, a fim de irem para onde devam ir”, “como bandos de aves que pousam numa ilha, para aí aguardarem que se lhes refaçam as forças, a fim de seguirem seu destino”. São estes os mundos transitórios, ou intermediários. Tudo convergiria para que os entendêssemos como mundos espirituais. Porém, Santo Agostinho disse que, “sim”, eles “têm uma constituição semelhante à dos outros planetas”; “sim”, “estéril é neles a superfície”, pois “os que os habitam de nada precisam” e, sobretudo, disse que a Terra, “durante a sua formação”, “já pertenceu ao número deles”. Não se trata, pois, de mundos espirituais, menos ainda de “colônias” neles edificadas, e sim de planetas inabitados fisicamente, a despeito de habitarem-nos espíritos errantes. Santo Agostinho chegou a afirmar que “não há desses mundos em nosso sistema planetário”. (Cf. Revista Espírita. Mai/1859. F.E.B., 2007, 3.ª ed., pp. 190/93.)
15. Cf. Revista Espírita. Mai/1863. Questões e problemas. Espíritos incrédulos e materialistas. 3.ª ed., F.E.B., 2007. p. 224.
17. Os Mensageiros, cap. 14.
18. Os Mensageiros, cap. 18.
19. KARDEC. A Gênese, XIV, 21.
21. Os Mensageiros, cap. 6.
22. Cf. Nosso Lar, caps. 3, 9, 17, 18 e 45.
23. KARDEC. O Céu e o Inferno, 2.ª parte, cap. VIII.
24. Em O Livros dos Espíritos, 872, disse Kardec: “É na morte que o homem é submetido, de uma maneira absoluta, à inexorável lei da fatalidade, porque ele não pode fugir ao decreto que fixa o termo de sua existência, nem ao gênero de morte que deve interromper-lhe o curso”.
25. Nosso Lar, cap. 44.
26. Nosso Lar, cap. 44.
27. Revista Espírita. Mai/1863. Exame das comunicações mediúnicas que nos são enviadas.
28. O Céu e o Inferno, 2.ª parte, cap. I, Sr. Sanson. III, n. 11.
29. O Livro dos Espíritos, 298.
30. O Livro dos Espíritos, 93.
31. Cf. “A Propósito do Perispírito”. 1.2. Pode o espírito perder seu perispírito?
32. Vampirismo. II. Parasitas e vampiros. 4.ª ed., Paidéia, 1996, p. 15.
33. Filipenses 3:21.
34. 1.ª Coríntios 15:43.
35. A Gênese, I, 39. Léon Denis Gráfica e Editora, 2008. Obs.: Se Kardec empregou o tratamento católico romano “saint Paul”, não há razão para que seja omitido por simples tradutores.
36. 1.ª Coríntios 15:49.
37. 1.ª Coríntios 15:53-54.
38. O Livro dos Médiuns, 56.
39. Revista Espírita. Jun/1868. A morte do Sr. Bizet, Cura de Sétif. A fome entre os espíritos. Sociedade de Paris, 14 de maio de 1868.
40. A Pedra e o Joio. Na Hora do Toque. As Normas de Kardec. 45.ª ed., FEB, 1996, p. 145.
Ahhh, como é bom ler um artigo, tendo por base "apenas" a codificação. Parabéns, é necessário acabar com a ficção na literatura espírita, é preciso separar o joio do trigo.
ResponderExcluirPois é Carlos, se todo espírita fosse um estudioso das Obras Fundamentais da Doutrina Espírita, não estaríamos vendo uma proliferação exacerbada de todo o tipo de literatura, filmes, peças teatrais, novelas, palestras, etc., etc., que se proclama 'espírita', prestando na realidade um desserviço ao Espiritismo.
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