domingo, 29 de janeiro de 2012

O Mestre Herculano


Por Dora Incontri


Lembranças da adolescência
Escrever sobre o mestre Herculano é para mim um dever e um deleite, pois o despertar de minhas pro­postas existenciais nesta vida se deu sob a sua influên­cia. Eu o admirava com fervor durante minha infância e adolescência, a ponto de ficar horas prestando aten­ção nas conversas que mantinha com a multidão de pessoas que frequentava sua casa, bebericando o café de D. Virgínia. Esta, sempre muito preocupada, queria me arranjar outras crianças para brincar, queria me dar alguma tarefa mais de acordo com minha idade… mas eu teimava em ficar na sala, embora fosse grande amiga da neta Regina, com quem costumava me entreter
.
Desde os 11, comecei a receber poemas psicogra­fados. Herculano os escutava, me estimulava e orien­tava. Aos 13 anos, já estava decidida a me tornar es­critora como ele. E ele me indicava livros, discutia po­etas de que gostávamos. Lembro-me de ele dizer o quanto apreciava Cecília Meirelles. Falávamos dos escritores russos – outra paixão – sobretudo Tolstoi, de quem ele tinha um retrato no escritório. Para fazer par, eu mandei enquadrar um de Dostoievski, que lhe dei de presente de aniversário. Atento à minha sede de aprender, o mestre me fazia dedicatórias esperançosas nos livros que me dava. Aos 14 anos, fez-me um fan­tástico poema, A Hora de Dora. Uma resposta a uma incipiente poesia que eu fizera em sua homenagem, cheia daquele ardente amor filial. Nele, Herculano procurava me trazer para a realidade presente, pois eu era muito fixada em recordações espontâneas de vidas passadas:
 
Dora cisma à luz da aurora
Musas cantam céu em fora.
Dora, Dora, por que chora?
Na distância a lua agora
Fria e trêmula descora,
Baço espelho a Dora enflora
Tempo antigo a Dora adora,
Dora sonha, rememora…
Ora às musas Dora ora
Morre a lua em cada aurora,
Toda aurora é cor de amora.
Canta agora, Dora, Dora,
Da poesia a voz sonora
Canta e exalta a nova Dora
Céu em fora terra em flora
Na pletora de outra hora.
Dora é Dora em cada hora,
Integrada tempo em fora
Na hora de Dora – ora!
Aos 15, inaugurei minha mediunidade de psicofo­nia, numa reunião mediúnica dirigida por ele. Como eu era novata, fez questão ele próprio de conversar com os três Espíritos que recebi logo na primeira vez. De­pois do terceiro, mandou que eu saísse da mesa, por­que já bastava para começo. Não me esqueço da do­çura firme com que falava com os Espíritos mais difí­ceis, nem da vibração de amor, com que suas palavras vinham carregadas.
 
A participação nas reuniões mediúnicas, dirigidas por Herculano, durou muito pouco. Logo em seguida, fui morar na Alemanha, com minha família, pela se­gunda vez. Então, em janeiro de 1979, meu irmão mais novo, Luis, ficou com hepatite em pleno inverno euro­peu. Apavorados com a possibilidade de os médicos alemães, como era de praxe, isolarem o menino num hospital de doenças infecto-contagiosas, viemos às pressas para o Brasil, para que ele fosse tratado em casa. Foi a oportunidade de nos despedirmos de Herculano.
 
No início de março, no dia 4, fomos lhe fazer uma visita, meus pais, meu irmão, já curado, que Herculano chamava de Luigino, e eu. Ele estava com muita difi­culdade de enxergar, com uma catarata avançada. Nas dedicatórias que nos fez, os emes tinham muitas per­nas. A serenidade de sempre, o acolhimento de cos­tume mataram nossas saudades.
 
Na noite do dia 9 de março, meus pais haviam saído e eu fiquei sozinha, em meu quarto, na casa da minha avó. Senti uma inexplicável vontade de chorar. Não sabia por que a sensação de melancolia. Entendi no dia seguinte, quando de manhã, recebemos o telefo­nema com a notícia de que Herculano se fora na véspera.
 
A imagem que guardo dele, de seu rosto, de seus gestos, de seu olhar é a da figura paterna, benevolente, bem humorada. Ao mesmo tempo, lembro de sua ines­gotável erudição, de sua paciência em ensinar, de sua despretensão ao abordar os temas mais difíceis e transcendentes.
 
Tinha eu 16 anos, quando acabou essa relação na terra, mas iniciou-se a leitura aprofundada e a crescente identifi­cação com seu pensamento. Ao mesmo tempo, em Es­pírito, sua inspiração nunca me falta, seu olhar nunca se afasta.
 
Das mãos de Herculano, recebi a compreensão da genialidade de Kardec e a veneração pelo mestre; re­cebi também o ideal da Pedagogia Espírita. Seguindo seus passos, fui estudar jornalismo e adotei a filosofia como objeto permanente de estudo. Obedeço ao seu conselho, em uma dedicatória que me fez, tentando “viver a poesia em ritmo existencial” e procuro dar minha contribuição para “aclarar os nevoeiros do mundo”. E ainda me integrando “no tempo de Dora”, ajustada ao tempo de agora, para melhor atuar no presente.
 
Esse testemunho pessoal parece-me re­levante para o entendimento do pensador. É que existe uma coerência vital entre o homem e a obra. Não havia contradição entre o que escrevia, o que falava, o que fazia e a vibração que irradiava. Herculano era um homem reto, bom, generoso, sobretudo sincero. Nele não havia dissimulações, meias palavras, mas pesso­almente não havia também agressividade. A exaltação que revelava às vezes nos escritos era indignação justa, era ardor na batalha das ideias. Não era ódio, violência ou qualquer sentimento antagônico que fosse – porque não havia nada disso em Herculano. Era essencial­mente sereno. Mas como ele mesmo explicou em sua obra O Ser e a Serenidade, a serenidade existencial não exclui a defesa viril de uma ideia ou a luta enga­jada por uma causa.
 
Lembro-me certa vez de uma conversa em família. D. Virgínia, como defensora natural do marido, refe­ria-se a certa liderança do movimento espírita de São Paulo que (como outras tantas) havia traído a confi­ança de Herculano e que, de amigo, passara a adversá­rio… Herculano, então, com palavras mansas, relatou um encontro que tivera com essa pessoa na rua e como lhe estendera a mão, como se compadecera de seu es­tado físico aparentemente doentio. Mas não dizia isso com nenhum laivo de pretensão à santidade, nenhum exibicionismo de parecer superior. Era fraternidade autêntica, era benevolência pura.
 
Era evidente que lutava por ideias, apaixonada­mente, mas não se deixava atingir por nenhum ressen­timento ou revolta contra as pessoas que pensavam diferentemente dele.
 
Jamais vi Herculano alterar a voz. Mas nunca senti algo de excessivamente açucarado, que pudesse ensejar qualquer desconfiança quanto à sinceridade absoluta do que dizia. Se tivesse que caracterizá-lo com poucas palavras, escolheria estas três: coerência, serenidade e benevolência.
 
O reencontro na maturidade
Apenas mais tarde, porém, pude compreender a pujança intelectual de Herculano Pires. Quando me aprofundei em suas obras e nas de Kardec é que pude aquilatar a contribuição única que Herculano dera ao desenvolvimento do espiritismo.
 
A primeira dessas contribuições está na própria compreensão da idéia espírita. Tratando-se de uma re­volução conceitual, uma quebra de paradigma, um passo inédito na história do conhecimento a sua dimensão e o impacto renovador de suas propostas ainda não foram entendidos pelos seus adeptos mesmos, que o tocam apenas superficialmente, carregados dos vícios religiosos do passado, incapazes de singrarem nos mares abertos, descortinados por Kardec.
 
A maioria dos espíritas no Brasil aceita o espiri­tismo como mais uma religião apenas, embora mantenham o discurso do tríplice aspecto. Herculano soube sondar as profundidades da obra de Kardec, entendendoa como uma revolução cultural, como uma pro­posta pedagógica, como ciência nova, como filosofia inédita, sem negar seu aspecto religioso.
 
Muitos espíritas ouvia eu desde pequena murmúrios neste sentido o consideravam fanático por Kardec, mas Herculano não tinha nenhum laivo de fa­natismo, era aliás uma pessoa avessa às idolatrias. O caso é que ele entendeu como ninguém o papel de Kardec no espiritismo. Ainda hoje, a maioria dos espí­ritas tem a ideia equivocada de que Kardec teria apenas organizado (por isso a ênfase na palavra codificador) uma revelação pronta, dada pelos Espíritos. Entretanto, apesar de ter havido sim uma revelação, a estruturação da filosofia espírita e a criação de uma metodologia de abordagem científica foram do homem Kardec. Herculano colocou em relevo esta contribuição de mestre.
 
Fez isso, não de maneira histórica, inserindo-o no seu contexto, mas na contemporaneidade, com que tra­vou permanente diálogo. Como jornalista-filósofo, Herculano esteve sempre ligado à realidade, ao turbilhão de idéias do seu tempo e procurou mostrar a co­nexão do pensamento espírita com o processo evolu­tivo da filosofia, das pesquisas e da história humana. Temos assim não um mero divulgador de idéias espíritas do século XIX, mas um pensador que pensou espiritamente o século XX.
 
Essa é a função de todo conhecimento vivo. O es­piritismo não pode se tornar letra morta, bíblica, que adotamos de forma postiça, como um credo fechado. É uma nova maneira de ver, pensar e sentir o mundo e assim pode iluminar o progresso do pensamento humano, interagindo com as ciências, as filosofias, as correntes pedagógicas.
 
Isso, porém, não é ecletismo. Certa vez, muitos anos atrás, ainda no início da minha jornada intelectual, travei conhecimento em Portugal com uma pessoa formada em Filosofia e ela me dizia indignada que Herculano era eclético. Como se sabe, tal adjetivo é altamente pejorativo no meio acadêmico, porque signi­fica colocar diferentes elementos, díspares, numa pro­posta de pensamento o que revelaria superficialidade e falta de conhecimento aprofundado das nuanças das diversas correntes. Uma salada mista, em suma. Essa crítica na época me irritou sobremaneira, mas foi excelente desafio, porque mergulhei com mais afinco do pensamento de Herculano, para desmentir a acusação. Nunca mais encontrei essa pessoa, mas depois de mais de 20 anos de estudo das obras de Herculano e tendo percorrido os bancos acadêmicos da graduação ao pós-doutorado, posso afirmar com toda certeza que não há o mínimo ecletismo em Herculano.
 
O filósofo de Avaré nunca perde a identidade do pensamento espírita, mas compreende que faz parte dessa identidade o enxergar os elos com outras formas de pensamento e entender a história das idéias humanas como uma construção coletiva de conhecimento e descoberta da verdade. Assim, dialogar e integrar evita o dogmatismo e a estagnação, mas o eixo da racionalidade metodológica, proposta por Kardec, é o que dá sentido e nos faz ver as possíveis conexões.
 
Podemos portanto dizer que o pensamento de Herculano Pires é amplo e aberto e por isso mesmo fiel aos princípios lançados por Kardec.
 
Foi essa leitura estimulante que me levou ao tra­balho que tenho procurado realizar de encarar o espiri­tismo como proposta cultural abrangente, estabelecendo um diálogo com o conhecimento acadêmico, para que ele não se feche nos guetos dos centros espíritas, apenas como forma de manifestação religiosa, e ainda muito carregada de misticismo.
 
 
Fonte: http://doraincontri.wordpress.com/


O Centro Espírita

Por J. Herculano Pires



Se os espíritas soubessem o que é o Centro Espírita, quais são realmente a sua função e a sua significação, o Espiritismo seria hoje o mais importante movimento cultural e espiritual da Terra.

Temos no Brasil – e isso é um consenso universal – o maior, mais ativo e produtivo movimento espírita do planeta. A expansão do Espiritismo em nossa terra é incessante e prossegue em ritmo acelerado. Mas o que fazemos, em todo este vasto continente espírita, é um imenso esforço de igrejificar o Espiritismo, de emparelhá-lo com as religiões decadentes e ultrapassadas, formando por toda parte núcleos místicos e, portanto fanáticos, desligados da realidade imediata. Dizia o Dr. Souza Ribeiro, de Campinas, nos últimos tempos de sua vida de lutas espíritas: "Não compareço a reuniões de espíritas rezadores!” E tinha razão, porque nessas reuniões ele só encontrava turba dos pedintes, suplicando ao Céu ajuda.

Ninguém estava ali para aprender a Doutrina, para romper a malha de teia de aranha do igrejismo piedoso e choramingas. A domesticação católica e protestante criara em nossa gente uma mentalidade de rebanho. O Centro Espírita tornou-se uma espécie de sacristia leiga em que padres e madres ignorantes indicavam aos pedintes o caminho do Céu. A caridade esmoler, fácil e barata, substituiu as gordas e faustosas doações à Igreja. Deus barateara a entrada a entrada do Céu, e até mesmo os intelectuais que se aproximam do Espiritismo e que tem o senso crítico, se transformam em penitentes. Associações espíritas, promissoramente organizadas, logo se transformam em grupos de rezadores pedinchões.

O carimbo da igreja marcou fundo a nossa mentalidade em penúria. Mais do que subnutrição do povo, com seu cortejo trágico de endemias devastadoras, o igrejismo salvacionista depauperou a inteligência popular, com seu cortejo de carreirismo político – religioso, idolatria mediúnica, misticismo larvar, o que é pior, aparecimento de uma classe dirigente de supostos missionários e mestres farisaicos, estufados de vaidade e arrogância. São os guardiães dos apriscos do templo, instruídos para rejeitar os animais sacrificiais impuros, exigindo dos beatos a compra de oferendas puras nos apriscos sacerdotais.

Essa tendência mística popular, carregada de superstições seculares, favorece a proliferação de pregadores santificados, padres vieiras sem estalo, tribunos de voz empostada e gesticulação ensaiada. Toda essa carga morta esmaga o nosso movimento doutrinário e abre as suas portas para a infestação do sincretismo religioso afro-brasileiro, em que os deuses ingênuos da selva africana e das nossas selvas superam e absorvem o antigo e cansado deus cristão.

Não há clima para o desenvolvimento da Cultura Espírita. As grandes instituições Espíritas Brasileiras e as Federações Estaduais investem-se por vontade própria de autoridade que não possuem nem podem possuir, marcadas que estão por desvios doutrinários graves, como no caso do roustainguismo da FEB e das pretensões retrógradas de grupelhos ignorantes de adulterados. Teve razões de sobra André Dumas, do Espiritismo Francês, em denunciar recentemente, em entrevista à revista Manchete, a situação católica e na verdade de anti-espírita do Movimento Espírita brasileiro.

A domesticação clerical dos espíritas ameaça desfibrar todo o nosso povo, que por sua formação igrejeira tende a um tipo de alienação esquizofrênica que o Espiritismo sempre combateu, desde a proclamação de fé racional contra a fé cega e incoerente, submissa e farisaica das pregações igrejeiras.

Jesus ensinou a orar e vigiar, recomendou o amor e a bondade, pregou a humanidade, mas jamais aconselhou a viver de orações e lamúrias, santidade fingida, disfarçada em vãs aparências de humildade, que são sempre desmentidas pelas ambições e a arrogância incontroláveis do homem terreno.

Para restabelecermos a verdade espírita entre nós e reconduzirmos o nosso movimento a uma posição doutrinária digna e coerente, é preciso compreender que a Doutrina Espírita é um chamado viril à dignidade humana, à consciência do homem para deveres e compromissos no plano social e no plano espiritual, ambos conjugados em face das exigências da lei superior da Evolução Humana. Só nos aproximaremos da angelitude, o plano superior da Espiritualidade, depois de nos havermos tornado Homens.

Os espíritas atuais, na sua maioria, tanto no Brasil como no mundo, não compreenderam ainda que estão num ponto intermediário da filogênese da divindade. Superando os reinos inferiores da Natureza, segundo o esquema poético de Léon Denis, na seqüência divinamente fatal de Kardec: mineral, vegetal, animal e homem, temos o ponto neutro de gravidade entre duas esferas celestes, e esse ponto é o que chamamos ESPÍRITA.

As visões fragmentárias da Realidade se fundem dialeticamente na concepção monista preparada pelo monoteísmo. Liberto, no ponto neutro, da poderosa reação da Terra, o espírita está em condições de se elevar ao plano angélico. Mas estar em condições é uma coisa, e dar esse passo para a divindade é outra coisa. Isso depende do grau de sua compreensão doutrinária e da sua vontade real e profunda, que afeta toda a sua estrutura individual. Por isso mesmo, surge então o perigo da estagnação no misticismo, plano ilusório da falsa divindade, que produz as almas viajoras de Plotino, que nada mais são do que os espíritos errantes de Kardec. Essas almas se projetam no plano da Angelitude, mas não conseguem permanecer nele, cedendo de novo a atração terrena da encarnação.

Muitas vezes repetem a tentativa, permanecendo errantes entre as hipóstases do Céu e da Terra. Plotino viu essa realidade na intuição filosófica e na vidência platônica. Mas Kardec a verificou em suas pesquisas espíritas, escudadas na observação racional dos fatos. Apoiado na Razão, essa bússola do Real, ele nos livrava dos psicotrópicos do misticismo, oferendo-nos a verdade exata da Doutrina Espírita. Nela temos a orientação precisa e segura dos planos ou hipóstases superiores, sem o perigo dos ciclos muitas vezes repetidos do chamado Círculo Vicioso das Reencarnações, que os ignorantes pretendem opor à realidade incontestável da reencarnação. Pois se existe esse círculo vicioso, é isso bastante para provar o processo reencarnatório. O vício não está no processo, mas na precipitação dos homens e dos espíritos não devidamente amadurecidos, que tentam forçar a Porta do Céu.

Se no Brasil sofremos os prejuízos do religiosismo ingênuo de nossa formação cultural, na França e nos demais países europeus -segundo as próprias declarações de André Dumas – o prejuízo provém de um cientificismo pretensioso, que despreza a tradição francesa da pesquisa científica espírita, procurando substituí-la pelas pesquisas e interpretações parapsicológicas. Esse menosprezo pedante pelo trabalho modelar de Kardec levou o próprio Dumas a desrespeitar a tradição secular da Revue Spirite, transformando-a num simulacro da revista científica do Ano 2.000.

As pesquisas da parapsicologia seguiram o esquema de Kardec e foram cobrindo no tempo, sucessivamente, todas as conquistas do sábio francês. Pegada por pegada, Rhine e seus companheiros cobriram o rastro científico de Kardec. O mesmo já acontecera com Richet na metapsíquica, com Crookes e Zollner e todos os demais.

Toda a pesquisa psíquica honesta é válida, nesse campo, até mesmo a dos materialistas russos atuais ficaram presas ao esquema de Kardec, o que prova a validade irrevogável desta. Começando pela observação dos fenômenos físicos, todas as Ciências Psíquicas, nascidas do Espiritismo fizeram a trajetória fatal traçada pelo gênio de Kardec e chegaram as suas mesmas conclusões.

As discordâncias interpretativas foram sempre marcadas indelevelmente pelos preconceitos e as precipitações da advertência de Descartes no Discurso do Método e pela sujeição aos interesses das Igrejas, como Kardec já assinalara em seu tempo. A questão da terminologia é puramente supérflua, e como dissera Kardec, serve apenas para provar a leviandade do espírito humano, mesmo dos sábios, sempre mais apegado à forma que ao fundo do problema.

No Espiritismo o quadro fenomênico foi dividido por Kardec em duas seções: Fenômenos Físicos e Fenômenos Inteligentes. Na Metapsíquica, Richet apresentou o esquema de Metapsíquica objetiva e Metapsíquica subjetiva. Na Parapsicologia os fenômenos espíritas passaram a chamar-se Fenômeno Psi, com divisão de Psicapa ( objetivos ) e Psigama ( subjetivos ). Quanto aos métodos de pesquisa, Crookes e Richet ativeram-se à metodologia científica da época, e Rhine limitou-se a passar dos métodos qualitativos para os quantitativos, inventando aparelhagens apropriadas aos processos tecnológicos atuais, apelando à estatística como forma de controle e comprovação dos resultados, o que simplesmente corresponde às exigências atuais nas Ciências.

Kardec teve a vantagem de haver acentuado enfaticamente a necessidade de adequação do método ao objeto específico da pesquisa. O próprio método hipnótico de regressão da memória, para as pesquisas da reencarnação aplicado por Albert De Rochas do século passado, foi aproveitado pelo Prof. Vladimir Raikov. Na Romênia, o preconceito quanto ao Espiritismo gerou uma nova denominação para Parapsicologia: Psicotrônica. Com esse nome rebarbativo, os materialistas romenos pretendem exorcizar os perigos de renascimento espírita em seu país.

Todos esses fatos nos mostram que a Doutrina Espírita não chegou ainda a ser conhecida pelos seus próprios adeptos em todo o mundo. Integrado no processo doutrinário de trabalho e desenvolvimento, o Centro Espírita carecia até agora de um estudo sobre as suas origens, o seu sentido e a sua significação no panorama cultural do nosso tempo. É o que procuramos fazer neste volume, com as nossas deficiências, mas na esperança de que outros estudiosos procurem completar o nosso esforço.

Lembrando o Apóstolo Paulo, podemos dizer que os espíritas estão no momento exato em que precisam desmamar das cabras celestes para se alimentarem de alimentos sólidos. Os que desejam atualizar a Doutrina, devem antes cuidar de se atualizarem nela.
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Autor: J. Herculano Pires
Na introdução do livro O CENTRO ESPÍRITA, Ed. Paideia
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sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Nos Descaminhos da Fascinação



Por Artur Felipe Azevedo


Há, em "O Livro dos Espíritos" primeira e principal obra da Codificação Espírita, um questionamento de Allan Kardec aos Espíritos Superiores nos seguintes termos: 459 - "Os espíritos influem sobre os nossos pensamentos e as nossas ações?" Cuja resposta foi: "A esse respeito sua influência é maior do que credes, porque, frequentemente, são eles que vos dirigem".

Allan Kardec, assim como os Espíritos Superiores que o inspiraram no trabalho de escrever e organizar as obras que compõe a Codificação Espírita, sempre se preocupou em alertar acerca dos perigos oriundos da influência dos espíritos imperfeitos. À esta influência deram o nome de "obsessão".

Didaticamente, a obsessão pode atingir três graus bem caracterizados, conforme podemos ler em "O Livro dos Médiuns":

1 - Obsessão simples , que é, segundo o Codificador, "quando um Espírito malfazejo se impõe a um médium, se imiscui, a seu mau grado, nas comunicações que ele recebe, o impede de se comunicar com outros Espíritos e se apresenta em lugar dos que são evocados.(...) Ninguém está obsidiado pelo simples fato de ser enganado por um Espírito mentiroso. O melhor médium se acha exposto a isso, sobretudo, no começo, quando ainda lhe falta a experiência necessária, do mesmo modo que, entre nós homens, os mais honestos podem ser enganados por velhacos. Pode-se, pois, ser enganado, sem estar obsidiado. A obsessão consiste na tenacidade de um Espírito, do qual não consegue desembaraçar-se a pessoa sobre quem ele atua".

(...)"Na obsessão simples, o médium sabe muito bem que se acha presa de um Espírito mentiroso e este não se disfarça; de nenhuma forma dissimula suas más intenções e o seu propósito de contrariar. O médium que se mantém em guarda raramente é enganado. Este gênero de obsessão é, portanto, apenas desagradável e não tem outro inconveniente, além do de opor obstáculo às comunicações que se desejara receber de Espíritos sérios, ou dos afeiçoados".

2 - A subjugação, que é "uma constrição que paralisa a vontade daquele que a sofre e o faz agir a seu mau grado. O paciente fica sob um verdadeiro jugo. A subjugação pode ser moral ou corporal".

"No primeiro caso, o subjugado é constrangido a tomar resoluções muitas vezes absurdas e comprometedoras que, por uma espécie de ilusão, ele julga sensatas: é como uma fascinação.

No segundo caso, o Espírito atua sobre os órgãos materiais e provoca movimentos involuntários. Traduz-se, no médium escrevente, por uma necessidade incessante de escrever, ainda nos momentos menos oportunos. Vimos alguns que, à falta de pena ou lápis, simulavam escrever com o dedo, onde quer que se encontrassem, mesmo nas ruas, nas portas, nas paredes.

Vai, às vezes, mais longe a subjugação corporal; pode levar aos mais ridículos atos. Conhecemos um homem, que não era jovem, nem belo e que, sob o império de uma obsessão dessa natureza, se via constrangido, por uma força irresistível, a pôr-se de joelhos diante de uma moça a cujo respeito nenhuma pretensão nutria e pedi-la em casamento. Outras vezes, sentia nas costas e nos jarretes uma pressão enérgica, que o forçava, não obstante a resistência que lhe opunha, a se ajoelhar e beijar o chão nos lugares públicos e em presença da multidão. Esse homem passava por louco entre as pessoas de suas relações; estamos, porém, convencidos de que absolutamente não o era; porquanto tinha consciência plena do ridículo do que fazia contra a sua vontade e com isso sofria horrivelmente".

3 - E, finalmente, a fascinação, que "é muito mais grave, no sentido de que o médium se ilude completamente. O Espírito que o domina ganha sua confiança ao ponto de paralisar seu próprio julgamento na análise das comunicações e lhe faz achar sublimes as coisas mais absurdas".

"Há Espíritos obsessores sem maldade, que alguma coisa mesmo denotam de bom, mas dominados pelo orgulho do falso saber. Têm suas idéias, seus sistemas sobre as ciências, a economia social, a moral, a religião, a filosofia, e querem fazer que suas opiniões prevaleçam. Para esse efeito, procuram médiuns bastante crédulos para os aceitar de olhos fechados e que eles fascinam, a fim de os impedir de discernirem o verdadeiro do falso. São os mais perigosos, porque os sofismas nada lhes custam e podem tornar cridas as mais ridículas utopias.(...) Procuram deslumbrar por meio de uma linguagem empolada, mais pretensiosa do que profunda, eriçada de termos técnicos e recheada das retumbantes palavras caridade e moral. Cuidadosamente evitarão dar um mau conselho, porque bem sabem que seriam repelidos. Daí vem que os que são por eles enganados os defendem, dizendo: 'Bem vedes que nada dizem de mau'. A moral, porém, para esses Espíritos é simples passaporte, é o que menos os preocupa. O que querem, acima de tudo, é impor suas idéias por mais disparatadas que sejam".


A fim de que pudéssemos reconhecer melhor os espíritos fascinadores, Kardec os descreve: "Os Espíritos dados a sistemas são geralmente escrevinhadores, pelo que buscam os médiuns que escrevem com facilidade e dos quais tratam de fazer instrumentos dóceis e, sobretudo, entusiastas, fascinando-os. São quase sempre verbosos, muito prolixos, procurando compensar a qualidade pela quantidade. Comprazem-se em ditar, aos seus intérpretes, volumosos escritos indigestos e frequentemente pouco inteligíveis, que, felizmente, têm por antídoto a impossibilidade material de serem lidos pelas massas. Os Espíritos verdadeiramente superiores são sóbrios de palavras; dizem muita coisa em poucas frases. Segue-se que aquela fecundidade prodigiosa deve sempre ser suspeita."

E aconselha: "Nunca será demais toda a circunspecção, quando se trate de publicar semelhantes escritos. As utopias e as excentricidades, que neles por vezes abundam e chocam o bom-senso, produzem lamentável impressão nas pessoas ainda noviças na Doutrina, dando-lhes uma idéia falsa do Espiritismo, sem mesmo se levar em conta que são armas de que se servem seus inimigos, para ridicularizá-lo. Entre tais publicações, algumas há que, sem serem más e sem provirem de uma obsessão, podem considerar-se imprudentes, intempestivas, ou desazadas."

Os Efeitos sobre o Movimento Espírita
A fascinação é realmente mais comum do que se pensa. Tal como uma epidemia, espalhou-se, e, atualmente, atinge o Movimento Espírita como uma doença moral muito séria. Aliada à falta de estudo das obras de Kardec, à tendência cultural ao sincretismo e à ausência de discernimento e de auto-crítica, ela é responsável pela edição de livros anti-doutrinários e comprometedores existentes no mercado da literatura espírita. Essas obras são escritas por médiuns e escritores muitas vezes ingênuos ou mesmo vaidosos que, sob o império da fascinação, não se dão conta do ridículo a que se submetem, comprometendo, inclusive, o sadio entendimento das massas acerca da própria Doutrina Espírita e do que ela verdadeiramente ensina.

A Salada Mística
A fascinação é, sem dúvida, a responsável por inúmeras condutas esdrúxulas observadas em núcleos ditos espíritas, tais como práticas de cunho supersticioso e místico, sem qualquer fundamento racional e doutrinário. Na esfera da divulgação, muitos indivíduos, embora instruídos, não estão livres da fascinação. Alguns, por confiarem excessivamente no seu pretenso saber, tornam-se instrumentos de Espíritos fascinadores e passam a divulgar, através de livros ou palestras, conceitos antidoutrinários nocivos à fé (raciocinada) espírita. Adotam e divulgam uma série de "ensinos" sem qualquer fundamentação doutrinária e um discurso místico-esotérico a qual chamam de "universalismo", sendo que, quando tais "ensinos" são comparados, nota-se não haver qualquer concordância e que cada um de seus representantes diz uma coisa, baseados que estão unicamente em suas férteis imaginações e arroubos místicos.

Crianças índigo, planeta chupão, apometria, poder curador de cristais e objetos materiais, profecias mirabolantes e aterrorizantes, milagres, intraterrestres, ETs que implantam chips na cabeça dos outros, terapias exóticas e milagreiras, 4ª e 5ª dimensões que a tudo explicam, astrologia, rituais e maneirismos... Enfim, é possível listarmos aqui centenas de fantasias, conceitos e noções que não encontram o menor respaldo, nem doutrinário, nem científico, e que só afastam o indivíduo da realidade, alienando-o e expondo-o a uma posição ridícula, levando de roldão a própria Doutrina Espírita perante a opinião pública.


Infelizmente, isso tudo é conduzido por espíritos perversos, levianos e/ou pseudo-sábios, que estimulam tais fantasias de modo a atrasar o progresso do humanidade e de seus ingênuos adeptos, fazendo-se valer de indivíduos incautos, de mente imaginosa e que carecem de aprofundamento e estudo das questões mais básicas do conhecimento, tanto do ponto-de-vista humano quanto espiritual.

São pessoas que ainda atrelam as questões do espírito ao maravilhoso, ao sobrenatural, ao milagreiro, ao aterrador, ao fantástico, esquecendo-se da razão, da racionalidade e da necessidade de tudo aferir para que então se possa, enfim, acreditar. Em tudo crêem, bastando que esteja um médium, um espírito ou algo que o valha a ditar alguma tolice sem sentido - desde que recheada de palavras bonitas e pomposas - para que sejam imediatamente aceitas como reflexo da Verdade e da mais pura "revelação" espiritual..

Quando chamados à realidade, vociferam, alegando terem a liberdade de pensarem como quiserem e que não se encontram "presos" a nenhuma "ortodoxia", não se importando que levam, de roldão, dezenas de outras consciências ao abismo de seus devaneios místicos, com que se aferram, julgando-se "especiais", "escolhidos"...


A Fascinação nos Grupos Espíritas
Allan Kardec alerta para outro grave perigo: o da fascinação de grupos espíritas. Iniciantes afoitos e inexperientes podem cair vítimas de Espíritos mistificadores e embusteiros que se comprazem em exercer domínio intelectual sob todos aqueles que lhes dão ouvidos, manifestando-se algumas vezes como guias, missionários, e até como Espíritos de outra natureza, advindos de algum planeta ou galáxia distante. O mesmo pode ocorrer com grupos experientes que se julguem maduros o suficiente. O orgulho e o sentimento de superioridade é a porta larga para a entrada dos Espíritos fascinadores. Portanto, deve-se tomar todo o cuidado quando na direção de centros espíritas e das sessões de atividades mediúnicas. Os dirigentes são alvos preferidos dos Espíritos hipócritas que, dominando-os, podem mais facilmente dominar o grupo.

Preocupado com tais descaminhos, o espírito Vianna de Carvalho ditou a seguinte mensagem, intitulada "Esquisitices e Espiritismo": "Ressumam com frequência nos arraiais da prática mediúnica esdrúxulas superstições que tomam corpo, teimosamente, entre os adeptos menos esclarecidos do Espiritismo, grassando por descuido dos estudiosos, que preferem adotar uma posição dubidativa, à coerência doutrinária de que sobejas vezes deu mostras o insigne Codificador.

Pretendendo não se envolver no desagrado da ignorância que se desdobra sob a indumentária de fanatismos repetitivos, alguns espíritas sinceros, encarregados de esclarecer, consolar e instruir doutrinariamente o próximo, fazem-se tolerantes com erros lamentáveis, em detrimento da salutar propaganda da Doutrina de Jesus, ora atualizada pelos Espíritos Superiores. A pretexto de não contrariarem a petulância e o aventureirismo, cometem o nefando engano de compactuarem com o engodo, desconcertando as paisagens da fé e, sem dúvida, conspurcando os postulados kardecistas, que pareceriam aceitar esses apêndices viciosos e jargões deturpadores como informações doutrinárias. (...)


De uma lado, é a ausência de estudo sistemático, de autodidatismo espíritico, haurido na Codificação, de atualização doutrinária em face das conquistas do moderno pensamento filosófico e tecnológico; doutro, é o desamor com que muitos confrades, após se adentrarem no conhecimento imortalista, mantêm atitude de indiferença, resguardando a própria comodidade, por egoísmo, recusando-se a experimentar problemas e tarefas, caso se empenhassem na correta difusão e no eficiente esclarecimento espírita; ainda por outra circunstância, é a falsa supervalorização que se atribuem muitos, preferindo a distância, como se a função de quem conhece não fosse a de elucidar os que jazem na incipiência ou na sombra das tentativas infelizes; e, normalmente, é porque diversos preferem a falsa estima em que se projetam ilusoriamente a desfavor do aplauso da consciência reta e do labor retamente realizado...

...E surgem esquisitices que recebem as manchetes do sensacionalismo da Imprensa mais interessados na divulgação infeliz que atrai clientes, do que na informação segura que serve como luzes do esclarecimento eficiente.

Médiuns e médiuns pululam nos diversos campos da propaganda, autopromovendo-se, mediante ridículos conciliábulos como 'status' de fantasias vigentes no báratro em que se converteu a Terra, sem aferição de valores autênticos, com raras exceções, conduzindo, quase sempre, a deplorável vulgaridade a nobre Mensagem dos Céus, assim chafurdando levianamente nos vícios que incorrem. Fazem-se instrumentos de visões extravagantes e dizem-se dialogando com anjos e santos desocupados, quando não se utilizando, ousadamente, dos venerandos nomes de Cristo e Maria, dos Apóstolos e dos eminentes sábios e filósofos do passado, que retornam com expressões da excentricidade, abordando temas de somenos importância em linguagem chã, com despautérios, em desrespeito pelas regras elementares da lógica e da gramática, na forma em que se apresentam. Parecia que a desencarnação os depreciara, fazendo-os perder a lucidez, o patrimônio moral-intelectual conseguido nos longos sacrifícios em que se empenharam arduamente. Prognosticam, proféticos, os fins dos tempos chegados e, imaginosos, recorrem ao pavor e à linguagem empolada, repetindo as proezas confusas de videntes do pretérito , atormentados que são, a seu turno, no presente.


Utilizando-se das informações honestas da Ciência, passam à elaboração de informes fantásticos, fomentando débeis vagidos de 'ciência-ficção', entregando-se a debates e provas inexpressivas retiradas de lacônicos telegramas de agências noticiosas, com que esperam positivar seus informes sobre a vida em tais ou quais condições, nesse ou naquele Planeta do Sistema Solar, ou noutra galáxia que se lhe torne simpática, como se a Doutrina já não o houvera oportunamente conceituado com segurança a questão, à Ciência competindo o labor de trazer a sua própria afirmação, sem incorrerem os espiritistas no perigo do ridículo desnecessário...

Outras vezes entregam-se à atualização de antigas crendices e feitiços, enredando os neófitos em mancomunações com Entidades infelizes ainda anestesiadas pelos tóxicos de última reencarnação, vinculadas às impressões do que acreditavam e se demoram cultuando...


Receitam práticas estranhas e confusas, perturbando as mentes que se encontram em plena infância da cultura como da experiência superior, tornando-se chefes e condutores cegos que são, conduzindo outros cegos, conforme a lição evangélica, terminando por caírem todos no mesmo abismo...

O Espiritismo é simples e fácil como a verdade quando penetrada. Deixá-lo padecer a leviana aventura de pessoas irresponsáveis, ingênuas ou malévolas, é gravame de que não se poderão eximir os legítimos adeptos da Terceira Revelação.


(...)Cabem, frequentemente, sempre que possíveis, as honestas informações entre Doutrina Espírita e Doutrinas Espiritualistas, prática espírita e práticas mediúnicas, opinião espírita e opiniões medianímicas, calcadas na Codificação Kardequiana, que delineou, aliás, com muita propriedade, as características do Espiritismo, conforme se lê na Introdução de 'O Livro dos Espíritos', estando presente em todo o Pentateuco, que desdobra os postulados mestres em incomparáveis estudos de perfeita atualidade, a resistirem a todas as investidas da razão, da técnica e da fé contemporâneas".

Questão de Coerência
Como já pudemos constatar em vários artigos, não só o Codificador e os Espíritos ligados diretamente à Codificação se preocupavam com os rumos do movimento Espírita e a nefasta tendência das ideias demasiado heterodoxas e suas infiltrações no Movimento Espírita, mas também outras entidades espirituais têm atualmente evidenciado grande preocupação com a invasão de práticas e conceitos estranhos advindos do Orientalismo e do Africanismo, que são respeitáveis, mas que não coadunam com os ensinamentos espíritas.

Portanto, estudemos, pois, a Doutrina Espírita, e atentemos para os desvios que sorrateiramente encarnados e desencarnados propõem de maneira leviana e até irresponsável, para que, amanhã, não caiamos nós nas teias e descaminhos da fascinação.
 
Fonte: http://espiritismoxramatisismo.blogspot.com



quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

AS AFINIDADES NO MUNDO ESPIRITUAL



Por Maria das Graças Cabral

Vivemos em um mundo material, onde as afinidades se fazem presentes das mais diversas formas face à globalização. Buscamos estar inseridos em algum contexto, onde possamos compartilhar algum tipo de sentimento, interesse, gosto, ideologia, religião, lazer. Esse compartilhar faz com que nos sintamos aceitos, compreendidos e partícipes, pois o ser humano é gregário. Não obstante, de acordo com os ensinamentos espíritas, quando do retorno ao plano espiritual, levaremos conosco os mesmos gostos, qualidades e defeitos. Ou seja, seremos as mesmas pessoas na busca de interação com os nossos afins.

Por conseguinte, nos dizem os Mestres da Codificação, que no mundo espírita seus habitantes também se sentirão atraídos por afinidades de sentimentos, gostos, e objetivos, esclarecendo que essas afinidades permitem a reunião dos mesmos, formando grupos ou famílias.

Tentando esclarecer o assunto, Kardec indaga se diante da grande diversidade de níveis evolutivos, os Espíritos, estariam “misturados” no plano espiritual, em razão da inexistência de regiões delimitadas para os gozos e sofrimentos, de acordo com os ensinamentos ministrados pela espiritualidade superior. E respondem os Mestres, que “Sim e Não”, acrescentando que os Espíritos se vêem uns aos outros, mas se distinguem.

No que concerne à questão de se verem uns aos outros, é fato que os Espíritos se percebem e se diferenciam mutuamente através do perispírito, como os encarnados o fazem através dos corpos físicos.


Não obstante, afirmam os Mestres Espirituais, que a distinção se dará de forma mais efetiva pela atração oriunda das afinidades, que envolve a moralidade, os interesses, a intelectualidade; os sentimentos de amor e amizade, de ódio, vingança, ciúme, inveja; como também a ignorância e os vícios.

Para uma melhor compreensão de como se dá essa relação, Kardec faz analogia com uma grande cidade terrena, habitada por homens e mulheres das mais diversas classes e condições. E nessa cidade, as pessoas se cruzam nas ruas ou nos mais diversos ambientes, se vêem, se encontram, sem entretanto se confundirem. Posto que, as amizades, associações, famílias, vão se formando pela semelhança de sentimentos, gostos, interesses, projetos em comum, crenças, etc. Oportuno observar, que tais atrações e similitudes, se darão tanto em relação aos bons como aos maus.

No que concerne ao mundo espírita, com toda a sua ‘infinitude‘, nos é dito que os bons Espíritos transitam por onde desejarem, objetivando influenciar os que se encontram submersos na ignorância e na dor. A natureza das relações entre bons e maus, consiste na missão dos bons em ajudar os maus a combater suas más tendências, para que possam alçar vôos mais altos na espiritualidade.

Esclarecem os Mentores, que os Espíritos maus, ao contrário dos bons, não terão acesso às regiões elevadas, pois em razão de seus vícios e más paixões não têm como se afastar do planeta de provas e expiações ao qual se encontram ligados, e são por ele atraídos.

Adiante, indaga o Codificador, como os Espíritos se comunicam entre si. A Espiritualidade Maior esclarece dizendo que “eles se vêem e se compreendem; a palavra é material; é reflexo da faculdade espiritual. O fluido universal estabelece entre eles uma comunicação constante; é o veículo da transmissão do pensamento, como o ar é para vós o veículo do som. Uma espécie de telégrafo universal que liga todos os mundos, permitindo aos Espíritos corresponderem-se de um mundo a outro.” (LE., p. 282) (grifei) Infere-se que a comunicação no mundo espiritual se faz através do pensamento.

Diante do exposto, entende-se portanto, que os encontros e agrupamentos de Espíritos afins, dar-se-á por todas as regiões do infinito mundo espiritual.

Á titulo de esclarecimento, podemos nos reportar por exemplo, à época da codificação, quando a plêiade de Espíritos Superiores que trabalharam com Allan Kardec na sistematização da Doutrina Espírita, se reuniam na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, como também nos mais variados grupos mediúnicos espalhados pelo mundo, objetivando a elaboração da grande obra Espírita.

Quando fazemos o evangelho, ou organizamos um grupo de estudos em nosso lar, quantos Espíritos se sentirão atraídos pelo interesse de participar, auxiliando na orientação dos trabalhos, estudando, ou sendo beneficiados pelo evangelho e pelas preces? E os Espíritos familiares que se reúnem no ambiente familiar, algumas vezes com o propósito de protegê-los, ou por estarem ainda em estado de perturbação?


Podemos também mencionar os Espíritos amantes da ciência, das artes, da literatura, da política, que se reúnem nos mais diversos centros de pesquisas espalhados pelo mundo, nas academias, nos parlamentos. Há os que se agregam aos grupos espíritas, igrejas, casas de caridade.


Não obstante, de acordo com a Espiritualidade maior, podem os Espíritos por afinidade de sentimentos e/ou objetivos, reunirem-se nos mundos transitórios, como nos mais diversos orbes espalhados pelo universo infinito, dependendo obviamente do seu grau evolutivo.


Em contrapartida, os Espíritos enredados no mal, se arrastam nos guetos, e nos antros do vício juntamente com seus afins. Muitos permanecem nos presídios, favelas, castelos ou mansões.


E para finalizar, muito comumente, ouvimos de médiuns portadores de visão psíquica, o relato de Espíritos, em teatros assistindo espetáculos, em igrejas rezando, perambulando pelas ruas das cidades, nos ônibus, metrôs, etc.. Pois como nos dizem os Mestres Espirituais, “os Espíritos estão por toda parte; povoam ao infinito os espaços infinitos. Há os que estão sem cessar ao vosso lado, observando-os e atuando sobre vós.” Ou seja, o mundo espiritual interpenetra o mundo corporal e se estende ao infinito, acolhendo toda uma população de Espíritos, que se agrupam por toda parte, de acordo com seus graus evolutivos, afinidades e interesses.


REFERÊNCIA
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Ed. LAKE. SP/SP. 62ª edição. 2001, Livro II, VI.
 
 
 



segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

KARDEC e as PALAVRAS

Por Maria das Graças Cabral





Ao iniciarmos o estudo de O Livro dos Espíritos, nos deparamos em sua introdução, com o grande cuidado de Allan Kardec, para com as palavras a serem empregadas no corpo doutrinário espírita. Num primeiro momento, poderíamos entender que tal diligência, se devesse ao fato de ser o Codificador por formação acadêmica, um pedagogo, lingüista insigne, que falava alemão, inglês, italiano, espanhol e holandês. Escreveu gramáticas, aritméticas, estudos pedagógicos superiores; traduziu obras inglesas e alemãs. Ou seja, na condição de poliglota e profundo conhecedor da língua francesa, seu idioma pátrio, sabia da importância das palavras para que um discurso fosse claro, e alcançasse seu objetivo. 



Não obstante, poderíamos também considerar, que na condição de organizador de toda uma gama de conhecimentos, advindos de Espíritos de alta evolução para a estruturação de uma obra, que segundo J. Herculano Pires, seria “o código de uma nova fase da evolução humana”, buscasse ‘cuidar’ das palavras a serem empregadas nessa sistematização, de forma a evitar que o uso inadequado das mesmas, viesse a “desvirtuar” os preceitos doutrinários.

E assim, o Codificador inicia a Introdução de O Livro dos Espíritos dizendo que: - “Para as coisas novas necessitamos de palavras novas, pois assim, o exige a clareza de linguagem, para evitarmos a confusão inerente aos múltiplos sentidos dos próprios vocábulos.” Observa-se claramente, que o mestre trata a doutrina como algo inovador, ciente da grandeza de suas revelações. Sabia que os assuntos abordados, envolviam grandes questionamentos da humanidade, que até então nunca haviam sido tratados tão objetivamente. Não queria portanto, que palavras com sentidos já definidos, distorcessem os preceitos fundamentais da nova doutrina.

Em seguida, o Mestre Lionês reporta-se às palavras espiritual, espiritualista, espiritualismo, demonstrando que as mesmas já tinham uma significação bem definida - entendendo-se por espiritualismo - toda filosofia religiosa que prega a existência de um ser ou realidade distinto da matéria. Entendia Kardec, que não aplicando à Doutrina Espírita tais palavras, evitar-se-ia a multiplicação das já numerosas causas de ambigüidade e de duplo sentido, (anfibologia), que acabariam por gerar graves conflitos de entendimento.

Daí, o codificador estabelece que “em lugar das palavras espiritual e espiritualismo” - para designar a Doutrina dos Espíritos - a palavra adequada seria espírita ou espiritismo. E conclui afirmando, que “Os adeptos do Espiritismo serão os espíritas, ou se o quiserem, espiritistas.” Segundo Kardec, O Livro dos Espíritos tem como especialidade a Doutrina Espírita, e como generalidade o Espiritualismo, daí, a referida obra traz abaixo do título, as palavras Filosofia Espiritualista.

Ocorre, que o cuidado de Kardec, foi totalmente negligenciado pelos espíritas. É fato que identifica-se na abundância de obras publicadas, nos discursos e na fala da grande maioria dos espiritistas, não só palavras, mas teorias e filosofias, totalmente estranhas ao corpo doutrinário espírita, e que alteram frontalmente os seus preceitos.

Aliás, desde a morte de Kardec, o Espiritismo vem sofrendo cruéis distorções. Vale lembrar que a própria Revista Espírita, com a sua morte, caiu nas mãos de Pierre Gaëtan Leymarie, que por seu excessivo espírito de tolerância, desvirtuou a finalidade da mesma, abrindo suas páginas à propaganda de filosofias espiritualistas, inclusive à de Roustaing, que diverge frontalmente do Espiritismo.

Não obstante, faz-se por oportuno ressaltar, os desdobramentos sofridos pela palavra “espírita“, designada por Kardec aos adeptos da Doutrina dos Espíritos. O referido vocábulo, viria a ser acompanhado de certos adjetivos, visando fazer uma distinção ideológica no próprio meio espírita. Nos idos de 1860, quando o Brasil despertava para o estudo da nova doutrina, recém chegada ao país, já começavam a surgir divergências de pensamento com relação aos aspectos filosófico, científico e religioso da mesma. Diante da discordância, passaram os espíritas da época a serem identificados, dependendo da linha de pensamento, por espíritas científicos, espíritas místicos, ou espíritas kardecistas.

Com o passar do tempo, algumas adjetivações se consubstanciaram, como é o caso do “espírita cristão”, que é a denominação dada ao adepto do Espiritismo Cristão, lançado pelo advogado de Bodeaux e opositor de Kardec, Jean Baptiste Roustaing, na obra Os Quatro Evangelhos, editado pela FEB.


Hodiernamente, a variedade de adjetivos aumentou grandemente dentro do movimento espírita, posto que, se tem espírita, roustenguista, chiquista, andreluizista, laico, religioso, kardecista, ramatista, livre-pensador, etc. Pode-se asseverar que hoje, o movimento espírita é formado por numerosas correntes espiritualistas, conhecidas como Espiritismo.

Não obstante, na busca por uma identidade filosófica e/ou religiosa, e em razão da ‘anfibologia’ criada para a palavra ‘espírita’, aquele que se considera adepto da Doutrina dos Espíritos, positivada nas Obras Fundamentais que formam o Pentateuco, e codificadas pelo mestre Allan Kardec, identifica-se como “espírita kardecista“, ou simplesmente “kardecista“, distinguindo-se das demais correntes de pensamento espiritualista, e dos seguidores de cultos afro-brasileiros, os quais também se auto-denominam espíritas.

Alguns companheiros, julgam que “espírita kardecista” seria uma redundância, pois todo Espiritismo deveria ser kardecista. É fato que seria uma redundância, se não estivéssemos diante de tantas correntes espiritualistas que adotaram a denominação de espírita.

Vale ressaltar, que há inúmeros espíritas que não são kardecistas. Alguns nunca leram nenhuma obra codificada por Allan Kardec. Seriam considerados crentes. Não obstante, a Doutrina Espírita é uma doutrina anti-dogmática, racional e evolucionista, que prega a fé raciocinada, e exige de seus adeptos o estudo constante e aprofundado de seus princípios libertadores, positivados nas obras fundamentais, quais sejam: O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Evangelho Segundo o Espiritismo, O Céu e o Inferno, A Gênese, o pequeno livro introdutório ao estudo da doutrina O que é o Espiritismo e Obras Póstumas, que segundo J. Herculano Pires, representa o testamento doutrinário de Allan Kardec.

Diante do exposto, é fato que os cuidados do Codificador para que a Doutrina dos Espíritos não se ‘perdesse nas palavras’, não impediu que tal fato ocorresse.

Hodiernamente, aqueles que estudam a codificação com dedicação e de forma atenta, constatam com profundo pesar, a adulteração dos preceitos doutrinários, presentes nas traduções e nas novas edições das obras fundamentais da Doutrina Espírita; na ‘importação’ de filosofias estranhas aos preceitos espíritas presentes na vasta produção literária publicada e divulgada; nos discursos, falas e textos. Enfim, a anfibologia se faz presente no discurso espírita, apesar de todo o cuidado de Kardec em evitar que o Espiritismo viesse a se enredar em suas malhas, gerando os atuais conflitos de entendimento.

Aliás, é fato que o desvirtuamento da Doutrina dos Espíritos, já vai muito além das palavras e das fronteiras, posto que o Brasil, é o maior exportador de obras e de divulgadores espíritas.

Na verdade, a cada dia, me admiro mais e mais com o que leio, ouço e presencio, por parte de espíritas, independentemente de classe social ou do grau de escolaridade. Como também, me espanto com os rumos tortuosos tomados pelo movimento espírita brasileiro.

Não obstante, não podemos abandonar a luta. Alguns companheiros já me perguntaram: - Fazer o que, diante da dimensão do problema? Resposta que não quer calar: - Cada um faça a sua parte. Não sejamos omissos, covardes, ou acomodados, pois a responsabilidade é individual. Vamos com muito amor e disposição, viver, estudar e divulgar com fidelidade a Doutrina Espírita, positivada com brilhantismo nas obras fundamentais, pelo gênio do insigne codificador Allan Kardec. As conseqüências virão naturalmente com o tempo. Afinal, somos Espíritos eternos!




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
CABRAL, Maria das Graças. Quem foi Hyppolite Leon Denizar Rivail, mundialmente conhecido como Allan Kardec? IN: http://umolharespirita1.blogspot.com/
CABRAL, Maria das Graças. Os Inimigos do Espiritismo. (Parte II) IN: http://umolharespirita1.blogspot.com/
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Ed. LAKE, SP/SP, 62ª edição, 2001.
LARA, Eugênio. Kardecista ou Espírita? IN: http://www.espiritnet.com.br/

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

O MUNDO ESPIRITUAL SEGUNDO O ESPIRITISMO


Por Maria das Graças Cabral

 
Diante dos inúmeros conflitos de entendimento, motivados por escritos e/ou opiniões que contradizem a existência de ’colônias espirituais’, nos moldes da narrativa do espírito André Luiz, no livro Nosso Lar, o presente artigo, tratará do Mundo Espiritual, objetivando dirimir alguns equívocos suscitados pelo tema, com base nos preceitos Espíritas.


Não obstante, antes da abordagem do tema proposto, farei algumas considerações, que entendo de relevância, para dissipar entendimentos equivocados.


Inicialmente, observo um grande ‘mal-estar’ que se instala ao se questionar a existência das emblemáticas ‘colônias espirituais“. A razão de tal contrariedade, se dá pelo fato de ser a obra refutada (Nosso Lar), produto da mediunidade do grande e respeitado médium Chico Xavier. Ou seja, a grande legião de seguidores e admiradores do médium, entende que ao se questionar a veracidade das mensagens mediúnicas, em razão da falta de amparo doutrinário espírita, por ’tabela’ se põe em ‘xeque’ a moralidade, respeitabilidade e confiabilidade daquele que psicografou as obras.  

Entretanto, devemos observar, segundo os ensinamentos positivados em O Livro dos Médiuns, que por ser a Terra um planeta de provas e expiações, os Espíritos que aqui encarnam, são imperfeitos e suscetíveis às influências espirituais. Por conseguinte, todos os médiuns encarnados no orbe terrestre, por não serem Espíritos perfeitos, em algum momento de suas vidas e experiências mediúnicas, serão obsidiados, mistificados ou fascinados, como qualquer outro simples mortal. Cabendo ainda ressaltar, da grande complexidade que envolve o processo mediúnico, o qual estamos longe de compreendê-lo em profundidade e alcançar todas as suas nuances. 

Conquanto, é inquestionável que Chico Xavier, foi um homem que buscou vivenciar a moral evangélica, tendo utilizado sua mediunidade como instrumento de consolação aos aflitos. Através das cartas psicografadas, trazia notícias do mundo espiritual, amenizando as dores acerbas de mães, pais, filhos(as) e familiares, que vivenciavam a partida de seus entes queridos para o outro lado da vida.

Além de mitigar as dores da saudade, o médium os aconselhava a direcionar suas energias ao amparo dos desvalidos. Quantas casas de caridade foram instituídas e/ou apoiadas por pais e mães, que buscaram consolação na mediunidade de Chico?!. Indiscutível a grandiosidade do seu trabalho de beneficência, favorecendo com a venda de seus livros psicografados, inúmeras instituições de caridade, e a própria Federação Espírita Brasileira.

No que tange a Doutrina dos Espíritos, os problemas vieram com a produção literária dos Espíritos Emmanuel e André Luiz. Até porque, foram as obras dos referidos Espíritos, que levaram Chico Xavier a ser conhecido no Brasil e no mundo como representante do Espiritismo, passando tais livros a serem catalogados pela própria FEB como Obras Complementares da Doutrina Espírita. Hodiernamente, tais exemplares são mais afamados e lidos, que as próprias Obras Básicas da Codificação, havendo uma verdadeira inversão de valores.

Não obstante, vale lembrar que vários ’equívocos’ doutrinários firmados por Emmanuel, foram publicados no livro O Consolador, de sua autoria. Dentre as incorreções, a que ganhou maior notoriedade foi quando Emmanuel defendia a existência das “almas gêmeas”, em total desacordo com as Obras Básicas da Doutrina Espírita. Na oportunidade, foi a própria FEB, quem levantou a questão, em razão do alvoroço causado no meio espírita (J. Herculano Pires que o diga). Diante do transtorno, qual foi o posicionamento de Emmanuel? - Transferiu a responsabilidade para o médium Chico Xavier, que prontamente assumiu o erro.

Destarte, infere-se que, se nas demais obras ditadas pelo Espírito de Emmanuel, ou sobre sua fiscalização e direção, que é o caso das obras ditadas pelo Espírito de André Luiz, - identifica-se claramente inúmeras incongruências com a Doutrina Espírita, das duas uma: ou os referidos Espíritos ditaram entendimentos próprios, embasados em convicções religiosas e filosóficas não espíritas, “mesclando” com princípios espíritas, principalmente utilizando-se da moral evangélica, para disfarçar os seus reais objetivos(?!); ou, todas as incompatibilidades serão de responsabilidade do médium, que transformou ou procurou adequar as mensagens dos Espíritos, às suas próprias convicções íntimas! Duas possibilidades: mistificação ou animismo.

O mais intrigante, é que Emmanuel, que se apresentava como Guia Espiritual do médium, de personalidade autoritária, e de grande rigorismo para com seu tutelado; que se mostrava um intelectual (observemos que na obra O Consolador ele trata das mais diversas áreas do conhecimento humano); estudioso da Bíblia cristã (ditou várias obras voltadas para mensagens e análises de versículos bíblicos); além de se colocar perante Chico, como um mestre e defensor dos preceitos Espíritas, teria “deixado passar” tantos equívocos doutrinários?!

Oportuno ressaltar, que tais incorreções não são sequer questões de grande complexidade, pois quem quer que estude os preceitos espíritas, com seriedade e atenção, facilmente identificará os sofismas. Isto posto, vamos iniciar o estudo do mundo espiritual, com base nos preceitos propostos pela Doutrina dos Espíritos, codificada por Allan Kardec.

É fato que para estudarmos o mundo espírita, devemos abstrair dos conceitos materiais pertinentes ao mundo corpóreo. Como por exemplo, lugares com espaço definido, tangibilidade, ponderabilidade, necessidades e/ou sensações físicas. Não podemos ter por paradigma o mundo corpóreo, para compreender um outro mundo que foge totalmente à materialidade percebida pelos nossos sentidos.

O Espírito em seu processo evolutivo, passa pela encarnação no mundo material para alcançar a perfeição. Cumprida sua missão no plano físico, o Espírito imortal, retorna ao mundo espiritual, o qual “preexiste e sobrevive a tudo”. Nos dizem os Espíritos Superiores que, “O mundo corpóreo poderia deixar de existir, ou nunca ter existido, sem com isso alterar a essência do mundo espírita.” Importante pontuar, que não é pelo fato de o mundo espiritual preexistir ao mundo corpóreo, que este seja uma cópia daquele, como muito comumente se propaga. (LE, p. 85 e 86)

No que tange à “localização” do mundo espiritual, esclarecem objetivamente os Mestres da Codificação, que os Espíritos não ocupam uma região circunscrita e determinada no espaço. Asseveram que os Espíritos estão por toda parte; povoam ao infinito os espaços infinitos. Há os que estão sem cessar ao vosso lado, observando-os e atuando entre vós, sem o saberdes (...) mas nem todos vão a toda parte, porque há regiões interditadas aos menos avançados.” (LE., p. 87) (grifei)

Observemos, que para tal assertiva, não cabem distorções interpretativas. Os Espíritos Superiores são enfáticos ao afirmar que os Espíritos não ocupam regiões delimitadas na espiritualidade! Infere-se do exposto, que obviamente os Espíritos não delimitam espaços construindo nichos, para se abrigarem, se tratarem, se alimentarem, etc., pois não é assim que ‘funciona’ o mundo espiritual!

Outro aspecto relevante a ser considerado, diante dos ensinamentos acima propostos, diz respeito à ligação psíquica e emocional do Espírito ao mundo material. Nada mais comum, que o relato feito por portadores de visão psíquica, de Espíritos que transitam em suas casas, museus, bibliotecas, ruas, praças, bares, teatros, hospitais, cemitérios, etc., etc. Em contrapartida, muitos outros não sabem onde estão, afirmam estarem cegos, perdidos, imersos em profunda escuridão. Isto porque, são infinitas as possibilidades, do ’estar’ no mundo espírita, dependendo do psiquismo de cada indivíduo.

É fato que o Espírito errante, aspirando por um novo destino, poderá passar longos períodos no estado de erraticidade (no mundo espiritual). E aí asseveram os Mestres da Codificação, que existem mundos particularmente destinados aos seres errantes, mundos que eles podem habitar temporariamente, espécie de acampamentos, de lugares em que possam repousar de erraticidades muito longas, que são sempre um pouco penosas. São posições intermediárias entre os outros mundos, graduados de acordo com a natureza dos Espíritos que podem atingi-los, e que neles gozam de maior ou menor bem-estar.” Acrescentam ainda, que os Espíritos que se encontram nesses mundos transitórios, podem deixá-los para seguir seu caminho. (LE., p. 234)

À título de esclarecimento, vale pontuar que os referidos mundos transitórios, de superfícies estéreis, se tornarão oportunamente mundos habitados. (LE., p. 236/236-b) Ressalto o entendimento, para que não irrompa a concepção de que as emblemáticas ‘colônias espirituais’, se enquadrem nesta categoria.

Dando prosseguimento aos ensinamentos sobre os mundos transitórios, estejamos atentos à resposta dada pelos Mestres Espirituais, quando Kardec indaga se os mundos transitórios são ao mesmo tempo habitados por seres corpóreos. Respondem os Espíritos da Codificação que, “Não, sua superfície é estéril. Os que os habitam não precisam de nada.” (LE., p. 236-a) (grifei)

Diante da resposta apresentada, mais uma vez legitimamos o entendimento de que o espírito errante não precisa de nada, do que seria imprescindível ao encarnado no mundo material! Não precisa de nada, repetimos. Ou seja, não precisa de casa, alimentação, hospitais, transportes, etc., porque ele agora é ESPÍRITO. Sua condição é diversa, e por conseguinte suas necessidades não serão as mesmas de quando habitava um corpo físico em um mundo material, como já repetimos anteriormente.

Prossegue o Codificador perguntando. - Esses mundos seriam, então desprovidos de belezas naturais? Observa-se que quando Kardec argüi se tais mundos seriam destituídos de belezas naturais, estava certamente tendo como paradigma o que consideramos no planeta Terra como belezas naturais. Ou seja, os nossos bosques, jardins, mares, cachoeiras, enfim, tudo o que encanta aos nossos sentidos na condição de encarnados. Vejamos então o que respondem os Espíritos Superiores: - “A natureza se traduz pelas belezas da imensidade, que não são menos admiráveis do que as que chamais belezas naturais.” (LE., p. 236-b) Outra grande lição dada pelos Mestres da Espiritualidade, quando asseveram que existem belezas, as quais não correspondem ao nosso ‘padrão’ do que é bonito, agradável e perfeito.

Portanto, constata-se que os Espíritos errantes não precisam de florestas, jardins com flores exóticas, cascatas, para se sentirem reconfortados com a beleza de um mundo transitório. Na condição de espírito, a ‘imensidade’ de uma paisagem tem sua beleza própria.

Adiante, mais um questionamento de grande relevância é feito por Allan Kardec, no que concerne ao mundo espiritual, senão vejamos: - Um lugar circunscrito no Universo está destinado às penas e aos gozos dos Espíritos, de acordo com os seus méritos?

Vale observar, que mais uma vez o Codificador interroga da existência de um “lugar circunscrito no Universo”, reservado ao sofrimento, à purgação, ou à felicidade dos Espíritos. Na realidade, Kardec sabia da nossa carência de ‘visualizar’ um lugar definido, com área delimitada, e se possível com endereço certo, para que pudéssemos ter uma noção desse mundo que nos foge aos sentidos. Até porque, céu, inferno e purgatório eram tidos por lugares delimitados no mundo espiritual, fazendo parte da dogmática católica, e aceita pela maioria cristã. Daí, a oportunidade do questionamento feito por Kardec.

Vejamos então a resposta dada pelos Espíritos Superiores: - “Já respondemos a essa pergunta. As penas e os gozos são inerentes ao grau de perfeição do Espírito. Cada um traz em si mesmo o princípio de sua própria felicidade ou infelicidade. E como eles estão por toda parte, nenhum lugar circunscrito ou fechado se destina a uns ou a outros. (...)” (LE., p. 1011) (grifei)

Oportuno ressalvar que de acordo com o dicionário pátrio, o termo “circunscrito“, significa um lugar restrito, delimitado, já a palavra “fechado“, significa encerrado, trancado. Faço, tal ressalva para alertar que os Espíritos Superiores asseveram mais uma vez da não existência de locais delimitados, nem fechados para se vivenciar a felicidade ou a dor no mundo espiritual. Observe-se quando nos é dito que “cada um traz em si mesmo o princípio da sua própria felicidade ou infelicidade”.

Daí, Kardec oportunamente nos esclarece dizendo que: A felicidade está na razão direta do progresso realizado, de sorte que, de dois Espíritos, um pode não ser tão feliz quanto o outro, unicamente por não possuir o mesmo adiantamento intelectual e moral, sem que por isso precisem estar, cada qual, em lugar distinto. Ainda que juntos, pode um estar em trevas, enquanto que tudo resplandece para o outro, tal como um cego e um vidente que se dão as mãos: este percebe a luz da qual aquele não recebe a mínima impressão. Sendo a felicidade dos Espíritos inerente às suas qualidades, haurem-na eles em toda parte em que se encontram, seja à superfície da Terra, no meio dos encarnados, seja no Espaço”.(Revista Espírita. Março de 1865, p. 100) (grifei) Em face de tão claros ensinamentos, mais uma vez encontramos legitimação para contraditar e impugnar, a tese da existência de ’umbral’, ou ‘colônias espirituais’. 


A título de esclarecimento para aqueles que nunca leram a obra Nosso Lar, transcrevo o seguinte trecho em que o espírito de André Luiz, assevera que o Umbral começa na crosta terrestre, sendo uma zona obscura de quantos no mundo não se resolveram a atravessar as portas dos deveres sagrados” (...). (Nosso Lar, p. 79) Acrescenta ainda, que o dito Umbral funciona, como região destinada a esgotamento de resíduos mentais: uma espécie de zona purgatorial, onde se queima a prestações o material deteriorado das ilusões que a criatura adquiriu por atacado, menosprezando o sublime ensejo de uma existência terrena“. (...) “Concentra-se aí, tudo o que não tem finalidade para a vida superior, ressaltando que a Providência Divina agiu sabiamente, permitindo se criasse tal departamento em torno do planeta”. (grifei) (Nosso Lar, p. 79/81) 

Já a colônia espiritual denominada de Nosso Lar é descrita pelo autor espiritual como uma cidade de uma beleza impressionante, com “vastas avenidas, enfeitadas de árvores frondosas. Ar puro, atmosfera de profunda tranqüilidade espiritual”. (Nosso Lar, p. 58) Prossegue o autor informando da existência de uma praça no centro da cidade aonde se erguem o prédio da Governadoria, e os Ministérios. As residências ao entorno são ocupadas por funcionários dos Ministérios. Uma outra parte dos conjuntos residenciais que está fora desse circulo é constituída por pessoas ligadas aos funcionários dos Ministérios e podem ser transmitidos a outros de acordo com a vontade de seus proprietários. Além dessas residências, protegendo-as estão grandes muralhas protetoras.

Não obstante, diante dos ensinamentos transmitidos pelos Espíritos Superiores, e codificados por Allan Kardec, não temos como validar, as narrativas acima apresentadas. Vale ressaltar que tais obras seriam aceitáveis como romances de ficção e/ou de natureza espiritualista, mas nunca como uma obra complementar espírita.

É fato que caímos nas malhas do absurdo, em razão do materialismo visceral que nos aprisiona, impedindo vislumbrar um outro mundo, uma outra vida, que não seja nos moldes do mundo material em que vivemos. Fugimos com medo de uma realidade que não aceitamos e/ou não entendemos, e nos escondemos nos sonhos que nos oferecem e nos agradam, por não conseguirmos nos distanciar da materialidade. E assim viajamos e nos perdemos nas utopias.

Não obstante, de acordo com a Doutrina Espírita, quando retornarmos à verdadeira vida, poderemos nos sentir livres, seguros e felizes, tendo a nos recepcionar, nosso Guia Espiritual, familiares e amigos. Como também poderemos estar desesperados, cegos, perdidos em uma escuridão sem fim, profundamente revoltados e infelizes. Tudo dependerá das nossas condições consciênciais, emocionais e psíquicas. 

Por fim, asseveram os Mestres Espirituais da Codificação Espírita, que nesse mundo infinito e eterno, que é o mundo espiritual, “os Espíritos estudam o seu passado e procuram o meio de se elevarem. Vêem, observam o que se passa nos lugares que percorrem; escutam os discursos dos homens esclarecidos e os conselhos dos Espíritos mais elevados que eles, e isso lhes proporciona idéias que não possuíam.“ (LE., p. 227). Importante ressaltar, que os caminhos que percorre, não serão se arrastando pelo solo, nem voando como pássaros. Nos dizem os Espíritos Superiores que viajaremos pela força do pensamento e da vontade. E como se dará isso? Como descrever a luz aos cegos? Só vivendo prá saber.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

KARDEC, Allan, O Livro dos Espíritos – 1857. Tradução Ed. Lake, 1995, Herculano Pires

KARDEC, Allan, O Livro dos Médiuns - 1863, Tradução Ed. Lake, 2003, Herculano Pires
KARDEC, Allan, Revista Espírita - março de 1865, Ed. FEB, 2004.

XAVIER, Chico , Nosso Lar - Ed. Feb, 1944 - 45ª edição
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quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

COLÔNIAS ESPIRITUAIS

 
Desde a chegada do Espiritismo no Brasil, há décadas, vem se acumulando assustadoramente livros e livros de espíritas e espíritos que estão na prateleira do Espiritismo. Entretanto, basta um leitor mais cuidadoso confrontar o conteúdo com a base da Doutrina Espírita, O Livro dos Espíritos, que veremos o choque de conceitos, claramente expressos entre um e outro. Ao cúmulo deste confronto ideológico de conceitos dá-se o nome de “Colônias Espirituais”.


Os incautos podem então afirmar que tanto numa quanto noutra obra são transcritas palavras de espíritos e nada há para validar ou invalidar as afirmações. Contudo, ao curioso e atento leitor que pretenda se denominar Espírita, não há de ter passado despercebido bem no início de O Evangelho Segundo o Espiritismo – outra obra considerada básica no cerne doutrinário espírita – a referência ao Controle Universal do Ensino dos Espíritos (CUEE). Temos ali, revelados numa linguagem relativamente simples e inteligível, o caminho das pedras para a validação de uma obra espírita, inclusive e principalmente, o caminho de aferição da própria Doutrina Espírita, que não “caiu do céu” simplesmente, como acontece com tanta literatura fácil no meio.


O CUEE mostra a preocupação dos Espíritos, acatada por Kardec em todo o seu trabalho, do uso de metodologia, razão e bom senso. O cuidado no aceitar qualquer coisa que venha de um médium ou de um espírito está refletido no alerta do CUEE e também em toda a obra O Livro dos Médiuns.


Deparamo-nos então com dois tipos de erros: a preguiça de aferir pelo método aquilo que supostamente é revelado como novo e o descaso com o rico conteúdo doutrinário que, apesar de não estar fechado, ainda é jovem e fonte preciosa de estudos e revelações. E não raras vezes, a doutrina é rechaçada pela prática espírita vigente, virando mero objeto de ilustração, inspirando por aí, seus supostos “filhos” ou afiliados, mas que não trazem em suas obras, observações e práticas doutrinárias - o fruto que comprovaria seu DNA, se é que assim se pode dizer.


No mais, ainda na referência ao Controle Universal do Ensino dos Espíritas, temos o alerta tão especialmente registrado:


Os Espíritos Superiores procedem, nas suas revelações, com extrema prudência. Só abordam as grandes questões da doutrina de maneira gradual, à medida que a inteligência se torna apta a compreender as verdades de uma ordem mais elevada, e que as circunstâncias são propícias para a emissão de uma ideia nova. Eis porque, desde o começo, eles não disseram tudo, e nem o disseram até agora, não cedendo jamais à impaciência de pessoas muito apressadas, que desejam colher os frutos antes de amadurecerem. Seria, pois, inútil, querer antecipar o tempo marcado pela Providência para cada coisa, porque então os Espíritos verdadeiramente sérios recusam-se positivamente a ajudar. Os Espíritos levianos, porém, pouco se incomodando com a verdade, a tudo respondem. É por essa razão que, sobre todas as questões prematuras, há sempre respostas contraditórias.


Como é vida após a morte? Seria a pergunta chave que culmina em tanta controvérsia entre espíritas diversos.


Defensores do relato dos Espíritos Superiores, laboratório de estudos psíquicos de Kardec, e outras obras mais ligadas ao Espiritismo sério acham graça dos mitos que permeiam as crenças: umbrais, colônias, hospícios, hospitais, verdadeiros ‘elefantes brancos’ espirituais, que, em suma, se existissem, não justificariam a encarnação, pois sendo cópia do mundo terrestre, desnecessário seria aos espíritos deste mundo encarnarem para sua evolução.


O choque materialista trava a batalha entre razão e emoção por evitar conceber um mundo espiritual sem os acessórios terrenos.


Na instrução dos Espíritos da Codificação concluímos, após leitura atenta, que a Terra não é uma cópia do plano espiritual, sendo este o principal, e o material, secundário, que poderia até mesmo nem existir.


O mundo espiritual é fruto das nossas necessidades materiais e orgânicas enquanto espíritos encarnados, desnecessário, portanto, ao espírito desencarnado, cujo foco é o seu progresso intelectual e moral.


O ambiente terrestre também pode ser concebido como o laboratório onde iremos colocar em ação vivencial os nossos avanços. Se na erraticidade tivéssemos uma cópia da terra, encarnar seria supérfluo e desnecessário. Não haveria motivo para encarnar, se o mundo espiritual apresenta as mesmas condições materiais para se evoluir.


Em certa literatura que se denomina espírita lemos:


O Umbral – continuou ele, solícito – começa na crosta terrestre. É a zona obscura de quantos no mundo não se resolveram a atravessar as portas dos deveres sagrados, a fim de cumpri-los, demorando-se no vale da indecisão ou no pântano dos erros numerosos. [...] O Umbral funciona, portanto, como região destinada a esgotamento de resíduos mentais; uma espécie de zona purgatorial, onde se queima, a prestações, o material deteriorado das ilusões que a criatura adquiriu por atacado, menosprezando o sublime ensejo de uma existência terrena.


Entra então o conceito de existir. Será existência "real/material" ou "psíquica"?

Segundo O Livro dos Médiuns, nos redutos espirituais não há existência concreta, são de curta duração, transitórios, fluídicos... O Livro dos Espíritos afirma que não existe purgatório e nem local destinado a penas ou sofrimentos, mas aglomerações por afinidades de Espíritos ainda apegados à matéria. Necessidades materiais apenas são contempladas em mundos materiais e não num contexto espiritual.


Os espíritos na erraticidade se encontram numa dimensão invisível ao nosso olhar racional, mas tecnicamente podem estar aqui do nosso lado, se ainda apegados aos nossos impulsos primários e muito distantes, se avançados em sua evolução.


Cabe-nos entender principalmente que o caminho evolutivo é longo e penoso, não só para os que desligados do corpo terrestre, caminham para o fim destinado a todos os espíritos – o da purificação – como também aos que se encontram neste intervalo encarnatório, em lutas quixotescas contra as páginas de Kardec e dos Espíritos da Codificação que tão bem ilustram nossas dúvidas e anseios do porvir. Duvidas estas embaçadas pelos nossos olhos que se recusam a ver e por nosso orgulho que se recusa a entender.


REFERÊNCIAS

KARDEC, Allan, O Livro dos Espíritos – 1857. Tradução Ed. Lake, 1995, Herculano Pires

KARDEC, Allan, O Evangelho segundo o Espiritismo - 1863, Tradução Ed. Lake, 2003, Herculano Pires

XAVIER, Chico , Nosso Lar - Ed. Feb, 1944 - 45ª edição

Fonte: NEFCA - http://www.nefcateste.com/novo/node/225, IN: O Blog dos Espíritas