Por Maria das Graças Cabral
Na Revista Espírita do mês de novembro de 1859, Allan Kardec publica um artigo altamente esclarecedor sobre a veracidade ou não de certas doutrinas e revelações feitas por Espíritos. Na realidade, o Mestre nos dá uma aula sobre tal problemática, analisando as experiências mediúnicas de Swedenborg, e suas constatações pós mortem.
Inicialmente, o Codificador faz um breve resumo biográfico de Swedenborg, e comenta que o mesmo “é um desses personagens mais conhecidos de nome que de fato, ao menos para o vulgo.” Segundo Kardec, “suas obras muito volumosas e, em geral, muito abstratas, quase que só são lidas pelos eruditos.” Daí, para uns, “ele é considerado um grande homem, para outros, não passa de um charlatão, de um visionário, de um taumaturgo.”
Assevera o Codificador, que na realidade a doutrina defendida por Swedenborg deixa muito a desejar. E que o próprio Swedenborg, na condição de Espírito, está longe de aprová-La em todos os pontos! No entanto, segundo as palavras de Kardec, “por mais refutável que seja, nem por isso deixará de ser um dos homens mais eminentes do seu século.”
Afinal, quem foi Swedenborg? - Emmanuel Swedenborg, nasceu em 1688, em Estocolmo, e faleceu em Londres, em 1722, aos 84 anos de idade. Destacou-se em todas as ciências, especialmente na Teologia, na Mecânica, na Física e na Metalurgia. Em 1716, Carlos XII o nomeou seu assessor na Escola de Metalurgia de Estocolmo. A rainha Ulrica o fez nobre, e ele ocupou os pontos de maior relevo, com distinção, até 1743, época em que teve a sua primeira revelação espírita. Tinha então, 55 anos. Pediu demissão e não quis mais se ocupar senão de seu apostolado e do estabelecimento da doutrina Nova Jerusalém.
Allan Kardec observa que “mesmo rendendo justiça ao mérito pessoal de Swedenborg, como cientista e como homem de bem, não nos podemos constituir defensores de doutrinas que o mais elementar bom-senso condena.” À esse respeito, vale pontuar que hodiernamente, tal determinação kardeciana, é totalmente desconsiderada! Qualquer mensagem mediúnica, ou entendimentos pessoais de médiuns e/ou palestrantes famosos ou não, por mais esdrúxulos e contraditórios que sejam, são acatados, publicados e divulgados como preceitos espíritas válidos e procedentes.
Acrescenta o Codificador: - “Ele (Swedenborg) cometeu um equívoco dificilmente perdoável, não obstante sua experiência das coisas do mundo oculto: o de aceitar cegamente tudo quanto lhe era ditado, sem o submeter ao controle severo da razão. Se tivesse pesado maduramente os prós e os contras, teria reconhecido princípios irreconciliáveis com a lógica, por menos rigorosa que fosse. (...) A qualidade que a si mesmo se atribui o Espírito que a ele se manifestou bastaria para o por em guarda, sobretudo se considerarmos a trivialidade de sua apresentação. (...) Seus próprios erros devem ser um ensinamento para os médiuns demasiado crédulos, que certos Espíritos procuram fascinar, lisonjeando-lhes a vaidade ou os preconceitos por uma linguagem pomposa ou de aparências enganosas.” (grifei) Observemos o alerta de Kardec para o controle severo da razão!
Prosseguindo em seus esclarecimentos, o Mestre transcreve uma comunicação dada pelo Espírito de Swedenborg, na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, em 23 de setembro de 1859, na qual, o Espírito faz a abertura da sessão, pontuando dentre outras coisas, que sua moral espírita e a sua doutrina, não estariam isentas de grandes erros, os quais atualmente (na condição de Espírito) reconhece. Nega por exemplo, a “eternidade das penas“, como também a existência “do mundo dos anjos”. Assim se expressa o Espírito: “O que eu também dizia do mundo dos anjos, que é o que pregam os templos, não passava de ilusão dos meus sentidos; acreditei vê-lo, agia de boa-fé, mas enganei-me.” (grifei) Vale ressaltar aqui, o cuidado para as tais “cidades espirituais” tão em voga na literatura espiritualista!
Vejamos agora, algumas indagações feitas por Allan Kardec, e as respectivas respostas dadas pelo Espírito de Swedenborg:
- Qual foi o Espírito que vos apareceu, dizendo ser o próprio Deus? Era realmente Deus? Resposta - Não. Acreditei no que me falava porque nele via um ser sobre-humano e fiquei lisonjeado. (grifei)
- Por que ele tomou o nome de Deus?
Resposta - Para ser mais bem obedecido. (grifei) O Espírito utiliza-se do nome de personalidades famosas e respeitadas para que seja facilmente obedecido pelo médium lisonjeado e temeroso.
- Aquele Espírito que vos fez escrever coisas que hoje reconheceis como errôneas. Ele o fez com boa ou com má intenção?
- Não o fez com má intenção; ele próprio se enganou, porque não era suficientemente esclarecido. Agora percebo que as ilusões do meu próprio Espírito e de minha inteligência o influenciavam, mau grado seu. Entretanto, no meio de alguns erros de sistema, fácil é reconhecer grandes verdades. (grifei)
Oportuno observar na fala de Swedenborg, que o Espírito comunicante era de grau evolutivo inferior, e se deixava também influenciar pelas “ilusões” criadas por Swedenborg, “mau grado seu”!
- O princípio de vossa doutrina repousa sobre as correspondências. Continuais acreditando nessas relações que encontráveis entre cada coisa do mundo material, e cada coisa do mundo moral?
Resposta - Não; é uma ficção. (grifei)
- Poderíeis dizer-nos de que maneira recebíeis as comunicações dos Espíritos? Escrevíeis aquilo que vos era revelado à maneira de nossos médiuns, ou por inspiração?
Resposta - Quando me achava em silêncio e em recolhimento, meu Espírito ficava como que maravilhado, extasiado, e eu via claramente uma imagem diante de mim, que me falava e ditava o que deveria escrever; algumas vezes minha imaginação se misturava nisso. (grifei)
Diante de ensinamentos tão importantes, ministrados e exemplificados com tanta propriedade pelo Mestre Allan Kardec, constatamos da necessidade do estudo efetivo e aprofundado das Obras Fundamentais da Codificação, e da Revista Espírita. Só assim poderemos identificar e rechaçar a avalanche de mensagens de Espíritos desencarnados e/ou encarnados, produto de ilusões e mistificações, e que acabam por confundir e desvirtuar os preceitos doutrinários Espíritas, levando multidões de desavisados ao engano e a futuras decepções.
REFERÊNCIA:
KARDEC, Allan. REVISTA ESPÍRITA, Jornal de Estudos Psicológicos. Ano II, novembro de 1859. Ed. FEB., RJ/RJ, 2ª edição, 2004, p. 437/446.
Excelente texto que nos leva a reflexão de tantas comunicações espíritas (psicografias e psicofonias) que são tomadas como legítimas sem passar pelo crivo da razão.
ResponderExcluirQuero agradecer-lhe por mais um trabalho esclarecedor e, que Deus lhe dê sempre, a lucidez que anda faltando em muita gente que usa a Doutrina Espírita sem perceber que: "A quem muito foi dado, muito será pedido". Que Jesus nos conceda a Sua paz.
ResponderExcluirEstou estudando Emanuel Swedenborg.
ResponderExcluirÉ muito bom conhecer e entender, a opinião de um mestre no assunto.
Kardec é o meu norte.
Obrido ao blogger pelo texto.
Bom dia! Excelente texto, para colaborar, somente destaco que o místico faleceu em 1772. Parabéns!
ResponderExcluirBom dia!!!
ResponderExcluirÓtimo texto!
dentro desse contexto, seria impossível distinguir o verdadeiro do falso, estando mais propício à tudo ser falso...
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