Por Maria das Graças Cabral
O tema
do presente artigo adveio do questionamento feito por um leitor do blog Um Olhar
Espírita, quando indagou se seria possível a existência de crianças na erraticidade, posto
que, no grupo espírita que frequenta muito comumente elas se apresentam nas
reuniões mediúnicas desenhando flores.
Para alcançarmos o entendimento do assunto em pauta, precisamos pontuar
e analisar alguns aspectos propostos em O Livro dos Espíritos. Inicialmente trataremos
de “períspirito”. Asseveram os Mestres da Espiritualidade, que o Espírito é
envolvido por uma substância vaporosa, denominada por Kardec de “períspirito”,
que é retirado do “fluido universal de cada globo”.
Pode-se atribuir ao períspirito duas finalidades. Lembrando que
ainda estamos longe de conhecer todos os seus atributos. Dizem-nos os Espíritos
da Codificação, que na condição de encarnado, ele serve de liame entre o
Espírito e o corpo material.
Já para o desencarnado, o períspirito funciona como o envoltório
semimaterial, que toma a forma ao “arbítrio” do Espírito. Portanto, afirmam os
Mestres Espirituais que é através do períspirito que aquele “aparece algumas
vezes, seja nos sonhos, seja no estado de vigília, podendo tomar uma forma
visível e mesmo palpável”. (O Livro dos Espíritos, questão 95)
Importante tais elucidações, para clarificar que o Espírito se
apresentará tomando a forma a seu alvedrio, objetivando ser reconhecido por
aqueles que o conheceram sob tal roupagem, ou para atender outras questões de
seu interesse. Entretanto, comumente será visto sob a forma e identidade de sua
última encarnação.
Senão vejamos o questionamento feito por Kardec a respeito: - “Como
a alma constata a sua individualidade, se não tem mais o corpo
material”. Respondem os Espíritos que através do períspirito representará
a aparência da sua última encarnação. (O Livro dos Espíritos, pergunta
150-a) (grifos nosso)
No que tange a volta ao mundo espiritual, oportuno ressaltar que
a consciência de si mesmo e de sua condição espiritual não se faz de pronto. Daí,
grande parte dos Espíritos vivenciam o chamado “estado de perturbação”. Asseveram
os Espíritos da Codificação, que tal estado varia de acordo com o grau
evolutivo do desencarnado. “Aquele que já está depurado se reconhece quase
imediatamente, porque se desprendeu da matéria durante a vida corpórea enquanto
o homem carnal, cuja consciência não é pura, conserva por muito tempo mais a
impressão da matéria”. (O Livro dos Espíritos, p.164)
Pode-se inferir de tal assertiva, que as pessoas mais
espiritualizadas, esclarecidas, moralizadas, se desvincularão mais rapidamente
do corpo físico e das questões próprias da vida material, tomando consciência
de si mesmas, e da realidade espiritual que as envolve.
Em contrapartida, a grande parte dos que vivem às voltas apenas
com as questões próprias da vida material, levará um tempo considerável para se
libertar das sensações e impressões do corpo físico, como das questões
cotidianas que dizem respeito ao mundo dos encarnados.
Ao tratar do “retorno à vida espiritual”, Kardec indaga na
questão 149 de O Livro dos Espíritos, em que se transforma a alma no instante
da morte. Respondem os Espíritos Superiores que “volta a ser Espírito, ou seja,
retorna ao mundo dos Espíritos que ela havia deixado temporariamente”. Argui
então o Codificador na questão 150 da referida obra, se “a alma conserva a sua
individualidade após a morte”, ao que os Mestres respondem que o Espírito não a
perde jamais.
Portanto, pelo desenvolver das ideias, fica claro que é através
do períspirito que o Espírito tomará a forma que lhe convém, buscando retratar
a sua individualidade. Entretanto, a consciência de si mesmo e de sua condição
de desencarnado vai depender do tempo de duração do seu estado de perturbação, que
por sua vez dependerá de uma maior ou menor ligação com a vida material. Esse é
um preceito geral aplicável a todos os Espíritos que desencarnam no planeta
Terra.
Depois da regra geral apresentada, vamos adequá-la aos
indivíduos que desencarnam na infância. A esse respeito, vale ressaltar que tais
crianças poderão ser Espíritos com muito mais experiência do que os adultos que
ficaram no plano físico.
Aliás, asseveram os Mestres da Espiritualidade que tal evento é
bastante comum, e que “a duração da vida da criança pode ser, para o seu
Espírito, o complemento de uma vida interrompida antes do tempo devido, e sua
morte é frequentemente uma prova ou uma expiação para os pais”. (O Livro dos
Espíritos, perguntas 197/199)
Faz-se por oportuno observar que o Espírito que desencarna
criança, não é um “Espírito criança”. Já tem uma longa bagagem de experiências
a ponto de já encarnar em um corpo de grande complexidade, que é o caso do
corpo humano. Portanto, como dito anteriormente, pode até ser um Espírito muito
mais experiente e evoluído do que os pais.
Adiante questiona Kardec em que se transforma o Espírito de uma
criança morta em tenra idade. Aliás, particularmente nos países
subdesenvolvidos, é grande número de crianças que vivem poucas horas, dias, meses
ou alguns anos, vindo precocemente a desencarnar pelas mais diversas causas. Ao
que respondem os Espíritos: - “Recomeçar uma nova existência”. Ou seja, serão
preparados para uma nova encarnação. (O Livro dos Espíritos, pergunta 199-a)
Por fim, o Codificador indaga: - “Com a morte da criança o Espírito retoma imediatamente o seu vigor
primitivo”? Respondem os Mestres Espirituais: – “Assim deve ser, pois que está desembaraçado do seu envoltório
carnal; entretanto, ele não retorna a sua lucidez primitiva enquanto a
separação não estiver completa, ou seja, enquanto não desaparecer toda a
ligação entre o Espírito e o corpo”. (O Livro dos Espíritos,
pergunta 381) (grifos nosso)
Observa-se, portanto, que a forma infantil de se apresentar, se
deve ao estado de perturbação. Ou seja, é a forte ligação com o corpo material,
que não permite ao Espírito identificar-se no “vigor primitivo” como dizia
Kardec.
Diante do exposto, pode-se concluir que passado o estado de
perturbação, onde o Espírito tomará consciência de si mesmo e de sua condição
espiritual, não haverá porque se fazer representar tomando a forma infantil.
Não obstante, vale pontuar algumas hipóteses. Um Espírito
evoluído que passou por um breve período de perturbação ao desencarnar, poderá
tomar a forma de criança para confortar e ser reconhecido pelos pais,
familiares ou amigos encarnados que sofrem a saudade de sua partida precoce.
Muito comumente, pais que perderam filhos a mais de vinte,
trinta anos, relatam que viram, sonharam, falaram com suas crianças que se mostravam
com a mesma aparência que tinham ao desencarnar. Nesse caso, pode-se entender que
tais Espíritos, caso não mais estejam em estado de perturbação, procurassem
retratar a forma infantil para serem reconhecidos por genitores e/ou
familiares.
Mas, e as crianças que comparecem às reuniões mediúnicas
espíritas, ou são vistas transitando por casas, ruas, hospitais, templos, etc.?
Já sabemos a resposta. São Espíritos em estado de perturbação, ainda fortemente
ligados ao corpo material, sem consciência de si e de sua condição de
desencarnado.
Não obstante, pode-se considerar uma nova hipótese. Somos
sabedores que em razão da plasticidade do períspirito, e da capacidade que tem
o Espírito de moldá-lo ao seu arbítrio, Espíritos inferiores, não mais em estado
de perturbação, poderão apresentar-se como crianças, objetivando outros
interesses. Por que não? É outra possibilidade a se aventar.
E então o que fazer? Orar por todos, conversar mentalmente, e
buscar ajudá-los a se perceberem como Espíritos que são. Afinal não existem “Espíritos
crianças”, pois o período de infância, adolescência, maturidade e
envelhecimento, é uma condição do corpo físico, que obedece a esse processo orgânico
de maturação, próprio dos nativos do planeta Terra.
No que concerne ao Espírito, este tem a sua infância espiritual
dimensionada pelo grau de inexperiência diante das Leis Universais. A infância
espiritual se faz identificar pelo estado de ignorância. Como dizem os Mestres
Espirituais todos os Espíritos são criados simples e ignorantes.
Pode-se asseverar que será mediante o processo de evolução moral
e intelectual que o Espírito alcançará a maturidade. O corpo físico é apenas um
instrumento necessário para o aprendizado no planeta Terra. Morre o corpo infantil,
e sobrevive o Espírito imortal e eterno, com toda uma bagagem de aquisições
intelectuais e morais, advindas das múltiplas experiências reencarnatórias, e que
integram a sua individualidade.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Editora LAKE. São
Paulo/SP. 62ª edição. 2001.
Como sempre, os textos são elucidativos. E foi muito oportuna o seu destaque para a infância do espírito, bem diferente da infância física. Um grande abraço.
ResponderExcluirMuito obrigado pela atenção dada ao meu questionamento.Questão esclarecida!
ResponderExcluirAbraços,Arlindo.
Muito bom! Bastante explicativo.
ResponderExcluirEsclarecidíssimo, obrigado.
ResponderExcluirMaria das Graças Cabral, por favor gostaria que me respondesse uma dúvida que me tem deixado até aflito. Poderia, em breve escrever uma artigo sobre tal?
ResponderExcluirÉ sobre a existência da alma mesmo. Se o seu corpo for alterado fisicamente, sua mente, e suas características morais também serão. O Mal de Alzheimer(atualmente só Alzheimer) é uma doença na qual altera o estado do corpo a ponto da pessoa esquecer quem é, onde mora…Agora a pergunta fica, se a alma é o que controla nossa personalidade e é um elemento independente do corpo, então porque quando o corpo é alterado fisicamente a personalidade também é? O mesmo questionamento vai para o caso de Phineas Gage, que após um acidente teve sua personalidade alterada.
Se me responder ficaria muito agradecido.
Parabéns pelo artigo. Pude tirar todas as minhas dúvidas sobre o tema.
ResponderExcluirContinue firme na caminhada e que o Senhor te abençoe.