domingo, 4 de setembro de 2011

REFLEXÕES SOBRE AS OBRAS INTITULADAS ESPÍRITAS, FACE ÀS OBRAS BÁSICAS.





Maria das Graças Cabral

O presente texto tem por objetivo fazer uma reflexão sobre a exorbitante produção literária que se auto intitula ‘espírita’, e do crescente número de espíritas neófitos (ou não), que pensam tratar-se de espiritismo o que lêem nos livros de romances, mensagens, auto ajuda, ou artigos, em sua grande maioria psicografados (ditados por espíritos) e qualificados como literatura ‘espírita‘.


Também causa espanto e preocupação, cabendo profunda reflexão no que tange à precariedade e descuido das casas espíritas, e da própria Federação Espírita Brasileira, na dedicação ao estudo efetivo e sério da Codificação Espírita, em detrimento de obras ditas ’complementares‘.

No que concerne às tais obras ‘complementares’, faz-se por oportuno ressaltar que se a “Boa Nova” trazida por Jesus há mais de dois mil anos, ainda não foi compreendida pelos que se consideram cristãos, o que dizer da Doutrina Espírita, com um corpo doutrinário que abrange as mais diversas áreas do conhecimento humano, e tendo sido codificada a menos de dois séculos.

O fato é que diante da incomensurável fonte de ensinamentos e revelações que compõem a Codificação, tem-se a contrapor a incompreensão e precariedade dos estudos realizados até hoje. Daí, a constatação óbvia da desnecessidade de ’complementação’ para as Obras Básicas.

Até porque, tal ’complementação’ vem sendo feita através de literatura de conteúdo questionável, ditada por Espíritos que segundo a “escala espírita” apresentada didaticamente por Kardec na questão 100 de O Livro dos Espíritos, podem ser considerados da oitava classe, ou seja, a categoria de Espíritos Pseudo-Sábios cujos “conhecimentos são bastante amplos, mas julgam saber mais do que realmente sabem”.

E assim, a formação doutrinária vem se pautando em fontes suspeitas e conturbadas, causando o crescente desvirtuamento dos ensinamentos propostos pela Doutrina dos Espíritos, provocando entendimentos equivocados que vêem gerando polêmicas e discussões em torno do corpo doutrinário, como também levando ao descrédito o próprio espiritismo.

Importante ressaltar que os preceitos divulgados por essa grande leva de ‘espíritos escritores‘, em grande parte não se coaduna com o que estabelece a Codificação, por retratarem experiências e percepções individuais do Espírito, narradas através de um único médium, suscetível de obsessão, mistificação e fascinação.

É fato que estamos diante de uma verdadeira inversão de valores, posto que, para que possamos discernir se o que lemos, ouvimos ou assistimos é pautado, ou não, nos princípios espíritas, precisamos de um estudo profundo das Obras Básicas.

Allan Kardec, na Introdução do Evangelho Segundo o Espiritismo, quando trata da ‘Autoridade da Doutrina Espírita’ discorre sobre o ‘Controle Universal das Comunicações’ e pontua que “os Espíritos, em conseqüência das suas diferenças de capacidade, estão longe de possuir individualmente toda a verdade; que não é dado a todos penetrar certos mistérios; que o seu saber é proporcional à sua depuração; que os Espíritos vulgares não sabem mais do que os homens; que há, entre eles, como entre estes, presunçosos e falsos sábios, que crêem saber aquilo que não sabem; sistemáticos que tomam suas próprias idéias pela verdade; enfim, que os Espíritos da ordem mais elevada, que são completamente desmaterializados, são os únicos libertos das idéias e das preocupações terrenas”. (2003: p.17)

Preceitua ainda o Codificador que o primeiro controle a ser feito é o da razão, e do bom senso, acrescentando que “a única garantia segura do ensino dos Espíritos está na concordância das revelações feitas espontaneamente, através de um grande número de médiuns, estranhos uns dos outros, e em diversos lugares”. (2003: p. 17/18) - E foi este o procedimento utilizado por Allan Kardec para a Codificação Espírita.

Oportuno observar o item 246 de O Livros dos Médiuns quando os Espíritos tratam da obsessão, e nos dizem que - “há Espíritos obsessores sem maldade, que são até mesmo bons, mas dominados pelo orgulho do falso saber: têm suas idéias, seus sistemas sobre as Ciências, a Economia Social, a Moral, a Religião, a Filosofia. Querem impor a sua opinião e para isso procuram médiuns suficientemente crédulos para aceitá-las de olhos fechados, fascinando-os para impedir qualquer discernimento do verdadeiro e do falso. São os mais perigosos porque não vacilam em sofismar e podem impor as mais ridículas utopias. (...) Procuram fascinar por uma linguagem empolada, mais pretenciosa do que profunda, cheia de termos técnicos e enfeitada de palavras grandiosas como Caridade e Moral. Evitam os maus conselhos, porque sabem que seriam repelidos, de maneira que os enganados os defendem sempre, afirmando: bem vês que nada dizem de mau. (...) O que desejam antes de mais nada é dominar e impor as suas idéias, por mais absurdas que sejam”. (2002: p. 221/222) (grifei)

À esse respeito J. Herculano Pires em nota de roda pé acrescenta que no Brasil vem ocorrendo com espantosa intensidade obras psicográficas com essas características. No entendimento do tradutor da obra, isso se dá “em virtude da propagação da prática espírita sem o desenvolvimento paralelo do conhecimento doutrinário. Por toda parte aparecem publicações inoportunas, desviando a atenção do público dos problemas fundamentais do Espiritismo, excitando a imaginação e o orgulho de médiuns incultos que, ainda em desenvolvimento, se deixam empolgar pela vaidade pessoal, dando atenção aos elogios de companheiros menos avisados e sendo envolvidos por Espíritos pseudo-sábios, sistemáticos, imaginosos. Todo cuidado é pouco nesse terreno”. (2002: p. 221/222) (grifei)

Adiante, no capítulo XXVII, intitulado ‘Contradições e Mistificações‘, Kardec assevera, que se “deve considerar desde logo suspeita as predições com épocas marcadas e todas as indicações precisas referentes a interesses materiais‘. (...) “Jamais se deixar ofuscar pelos nomes usados pelos Espíritos para darem validade às suas palavras, (...) e desconfiar das teorias e sistemas científicos ousados”. (2002: p. 294)

Mais uma vez J. Herculano Pires, em nota de rodapé da obra em comento, afirma que “a falta de observação dessas instruções tem permitido a divulgação e aceitação de numerosas teorias pseudo científicas em nosso país e em todo o mundo, que contribuem para o descrédito do Espiritismo. A vaidade pessoal dos médiuns, de estudiosos da doutrina e até mesmo de intelectuais de valor inegável, estes sempre dispostos a criticar e a superar Kardec, tem levado essas pessoas ao ridículo, inutilizando-as para o verdadeiro trabalho de divulgação e orientação‘. (2002: p. 294) (grifei)

Diante do exposto, podemos concluir que estudando a Doutrina dos Espíritos, entenderemos as leis naturais da vida, saindo da condição infantil que considera sobrenatural, fantástico, ilusão, ou loucura tudo aquilo que não compreende.

Estudando as Obras Básicas, não nos tornaremos vítimas da ’credulidade’ que aceita como verdades, idéias esdrúxulas de Espíritos pseudo-sábios e sistemáticos, que embora em desacordo com a Codificação, são acatadas pelo fato de serem ditadas por Espíritos de nomes conhecidos, através de médiuns famosos e respeitados, mas que estão sujeitos aos processos obsessivos, de mistificação e fascinação como qualquer um de nós.

É através do estudo e conhecimento das Obras Básicas, que teremos condições para defender com segurança e serenidade a integridade da Doutrina que nos consola e liberta, pois a mesma já veio com seu preceitos formados pela Espiritualidade Superior, cabendo à Kardec na condição de Codificador organizá-la, e denominá-la de ‘Doutrina Espírita’.

Assim sendo, tudo o que estiver em desacordo com o que foi codificado, não é obra espírita, pois a Doutrina Espírita é a “Obra dos Espíritos Superiores“, que foi submetida por Kardec ao Controle Universal das Comunicações e está compilada em O Livro dos Espíritos, O que é o Espiritismo, O Livro dos Médiuns, O Evangelho Segundo o Espiritismo, A Gênese , O Céu e o Inferno e nos doze volumes da Revista Espírita.

3 comentários:

  1. Quanta lucidez, amiga! Bem característica sua. Cada vez fico mais feliz (dentro das possibilidades terrenas) de contar com a sua amizade. Muita luz!

    ResponderExcluir
  2. Concordo que as obras básicas sao pouco divulgadas e menos ainda estudadas metodicamente, mas nao podemos achar que desde kardec nenhuma informação nova foi-nos revelada, a informação sobre a existencia das colonias por exemplo nao é atestada apenas por um espirito e um medium , esta presente em toda a literatura espirita, mas na epoca, kardec precisava codificar o espiritismo e ao mesmo tempo defende-lo, por isso nao ha informações minuciosas, nao era a epoca de entrar em detalhes, mas se as obras bascias dizem que os espiritos se reunem em familias, se estudam para o seu melhoramento, e que no estado errante podem progredir e mais se podem criar objetos pelo poder do pensamento, qual a dificuldade em aceitar que façam tudo isso de forma organizada em colonias criadas por eles para esse fim?? nao creio haver nda de antidoutrinario nisso... por outro lado kardec é claro ao afirmar que nao existem espiritos errantes de animais no mundo espiritual, isso sim é inquestionável e as obras que dizem haver nao se pautam pela codificação, embora muitos apaixonados defendam isso, nao ha como negar que nas obras basicas a informação nao procede... é preciso cuidado para nao tacharmos tudo o que vem dos espiritos pós-kardec de anti-doutrinario ou de totalmente doutrinario... o que vejo no movimento espirita sao ambos os extremos.. eu aceito algumas coisas como a existencia de colonias espiritas e rejeito outras como a existencia de animais nelas... ha que convir encontramos coisas na propria codificação que hoje em dia nao sao mais aceitas cientificamente como por exemplo a existencia de satelites em marte que em A genese diz-se inexistentes e hoje ja se comprova que há... entao nao podemos tambem tratar a cdificação como um livro sagrado e irretoquivel

    abraços

    ResponderExcluir
  3. Jorge Luis, bom dia. Defendo a importância do estudo das Obras Fundamentais como 'paradigma' para a leitura e avaliação das demais obras que se auto intitulam espíritas. Parto do pressuposto que houve todo um cuidado do Espírito da Verdade para que os fundamentos fossem sólidos para a edificação da Doutrina. Se observarmos (como nos dizia com muita propriedade Herculano Pires) nós espíritas desconhecemos e estamos longe de ter um conhecimento efetivo do Espiritismo! Isto em razão da imensidade de informações passadas pela espiritualidade, e pela nossa falta de dedicação no estudo não só das obras fundamentais como da Revista Espírita e oitros escritos do codificador. Daí, questiono: - Se não tenho o domínio sequer dos fundamentos, como avaliar com critério seguro as demais 'revelações'? No que concerne às colônias espirituais, não concordo com a existência de cidades nos moldes do Nosso Lar. À esse respeito já escrevi alguns artigos nesse Blog, como já publiquei outros de autores diversos, na mesma linha de entendimento. Abraço.

    ResponderExcluir